quarta-feira, 30 de março de 2011

Jesualdo: "Joga, joga, joga!"

O regresso do FC Porto ao Estádio da Luz será vivido com a intensidade do costume por todos os elementos do plantel portista, mas há um, em particular, para quem voltar a pisar o relvado do estádio do Benfica terá um significado especial. O último jogo que fez ali custou a Hulk um afastamento dos relvados que se prolongou por quase três meses, obrigando-o a falhar 17 jogos do FC Porto e comprometendo as suas hipóteses de merecer uma chamada à selecção brasileira. Jesualdo Ferreira conhece o Incrível como ninguém e sabe que o regresso à Luz pode mexer com o brasileiro. Por isso mesmo, faz questão de lhe deixar uma mensagem pessoal e intransmissível. "Acredito que não me podem levar a mal por dar uma palavra pessoal ao Hulk: 'tenta ser emocionalmente forte, porque o contrário pode ter maus resultados. Que sejas capaz de te alhear do ambiente, dos acontecimentos, das notícias e de tudo e que jogues. Joga, joga, joga! Disse-te muitas vezes a mesma coisa no banco e repito agora: Joga!'"

Jesualdo Ferreira

"Mostrámos que ainda éramos nós os campeões"

 
"Os clássicos são jogos em que o quadro motivacional é absolutamente decisivo". A frase é de Jesualdo Ferreira, actual treinador do Panathinaikos, tricampeão nacional pelo FC Porto e um dos técnicos portugueses com mais "clássicos" no currículo. O último em que participou foi especial. A 2 de Maio de 2010 o FC Porto recebeu o Benfica no Estádio do Dragão. Os encarnados estavam a um ponto do título e ameaçavam fazer a festa em casa do arqui-rival, colocando um ponto final definitivo a um ciclo que quatro anos consecutivos de domínio portista no campeonato. Também dessa vez a motivação fez a diferença e o FC Porto conseguiu adiar a festa encarnada, vencendo por 3-1. No domingo, a história começa do avesso. A equipa agora dirigida por André Villas-Boas vai ao Estádio da Luz e uma vitória pode valer-lhe a confirmação de um título anunciado há algum tempo em casa do rival de sempre. Jesualdo Ferreira fala a O JOGO com conhecimento de causa sobre tudo o que esse clássico pode ser, mas também recorda como foi o do ano passado, o último em que participou.

Como é que se prepara um clássico como este?
A preparação de um clássico, qualquer clássico, é sempre diferente e depende do seu posicionamento no calendário, no momento que a equipa atravessa, nas implicações que tem e nas condições em que se encontra a equipa. De qualquer forma, são jogos em que o quadro motivacional é absolutamente decisivo e muitas vezes suplanta a preparação que se faz ao longo da semana, ainda que existam sempre detalhes e aspectos concretos específicos a cada jogo que é preciso considerar.

O jogo do Dragão, na última época, tinha uma carga emocional associada muito grande, Como é que foi vivido no balneário?
No jogo do ano passado, sabíamos nós e sabiam os jogadores que o campeonato estava perdido, mas estava em causa o nome do FC Porto, um certo sentimento de orgulho e uma dose considerável de revolta por causa de tudo o que tinha acontecido ao longo da temporada e que tinha limitado a nossa capacidade para discutir o título. Impedir a festa do Benfica em nossa casa foi uma questão de honra. Em poucas palavras, foi um jogo em que fomos melhores e isso apesar de termos de ultrapassar obstáculos sucessivos. Sofremos o golo do empate muito cedo na segunda parte, perdemos o Fucile e estivemos mais de 35 minutos a jogar com dez, mas mesmo assim conseguimos chegar ao 3-1.

Problemas que começaram antes do jogo, com a indisponibilidade do Falcao...

O Falcao tinha sido expulso em Setúbal, na jornada anterior, e com isso não prejudicaram apenas o FC Porto, mas também as hipóteses de ele lutar com o Cardozo pelo título de melhor marcador que, como todos sabem, o Falcao perdeu por apenas um golo. Aliás, essa expulsão coincidiu com a minha expulsão como treinador, porque há uma altura em que atingimos o limite. Mas é claro que a ausência do Falcao foi mais um obstáculo que tivemos de ultrapassar com um grande jogo no plano táctico, com uma grande disciplina, uma boa preparação, mas essencialmente com uma grande vontade de mostrar que ainda éramos nós os campeões.

Foi um jogo de raiva?
De raiva não. Acredito que os jogadores entraram ali com vontade de provarem algo a si próprios, de mostrar ao próprio país que ainda havia ali um campeão. Acredito que, de alguma forma, mostrámos nesse jogo que, em circunstâncias normais, teríamos capacidade para discutir de outra forma como o Benfica e o Braga, em particular durante os primeiros jogos da segunda volta, que foi quando se cavou a diferença entre as equipas.

A motivação foi decisiva?
O factor mental, motivacional, como já referi, é absolutamente determinante. Ao longo dos anos em que estive no FC Porto, preparei inúmeros jogos com o Benfica, disputei vários clássicos e ganhei muitas mais vezes do que perdi. Em todos esses jogos tivemos que lidar com quadros diferentes, quer em termos de enquadramento dos jogos, quer em termos motivacionais.

E acredita que o sentimento no balneário do Benfica será semelhante desta vez?
São jogos diferente e clubes diferentes e foi uma época diferente, mas acredito que exista um sentimento semelhante no balneário do Benfica. São campeões, jogam em casa e não vão querer abdicar do título sem dar luta. Creio que pode existir uma reacção parecida, mas não conheço os jogadores. Conhecia os meus, e sabia do que eram capazes.

Acha que o Benfica vai querer assumir o jogo, vai querer mandar em sua casa?
Creio que estaremos na presença de dois estados de espírito diferentes. De um lado, estará um FC Porto tranquilo, sabendo que vai ser campeão mais cedo ou mais tarde. Do outro, estará um Benfica orgulhoso a tentar evitar que isso aconteça e que terá certamente um posicionamento táctico que lhe permita assumir a iniciativa, mas que também pode dar alguma imprevisibilidade ao jogo.

O ambiente, que se espera intenso, pode influenciar o jogo?
Acredito que o factor casa e o ambiente criado pelo público podem ser importantes, embora seja difícil prever exactamente em que sentido. O FC Porto é uma equipa muito experiente e, muitas vezes, é precisamente neste tipo de ambientes que se supera. Em poucas palavras, este é um jogo em que se pode esperar tudo.


"Não sofrer derrotas até ao fim será um marco"

Jesualdo Ferreira ganhou três campeonatos ao serviço do FC Porto, um dos quais por uma diferença considerável. "Convém lembrar que ganhei esse campeonato com 20 pontos de avanço sobre o segundo e 23 sobre o terceiro. O que aconteceu depois, os pontos que nos tiraram, não têm nada a ver com aquilo que fomos capazes de produzir", recorda a propósito da época 2007/08. De resto, o ex-treinador portista não se surpreendeu com a carreira da equipa orientada por André Villas-Boas. "Só me surpreendeu a solidez inicial, na forma como foi capaz de aproveitar o descalabro do Benfica sem ceder. Basicamente, o FC Porto fez o que devia, que é vencer os seus jogos e, se houve alguma coisa surpreendente, foi a quebra do Benfica. Depois, também é preciso sublinhar a capacidade do FC Porto para se manter competitivo ao longo de toda a temporada. Se conseguir chegar ao fim sem derrotas, acredito que é um marco assinalável."

"O FC Porto não esqueceu a última visita à Luz"

A última visita do FC Porto ao Estádio da Luz marcou a história da última época. O FC Porto perdeu por 1-0 e viu Hulk e Sapunaru serem suspensos por quatro e seis meses respectivamente. Jesualdo Ferreira acredita que esse jogo será "um factor a considerar" no clássico de domingo. "Os acontecimentos da última época não estarão certamente esquecidos, nem pela equipa, nem pelos jogadores em concreto, e há muitos no plantel que viveram esse jogo e o seu final muito intensamente. Depois, tenho a certeza que antes do jogo esse tema será reavivado pela Comunicação Social. Sei que o FC Porto vai à Luz com vontade de ganhar o jogo, por mais do que um motivo, e também sei que o Benfica fará tudo para impedir essa vitória."


in "ojogo.pt"

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