Haverá uma larga maioria que lhe dará conta do desconforto que seria carregar pianos vestido de fato e gravata, mas já tocar piano vestido assim não parece incomodar ninguém. Este FC Porto, com a evidente marca de água de Vítor Pereira, é carregador e pianista durante o mesmo jogo, alternando a função conforme os acontecimentos dentro do relvado. Os que só apreciam sinfonias talvez regressem a casa algo desiludidos, quem espera, antes de mais, vitórias inequívocas nem sequer se lembrará dos pontapés para a bancada de Maicon, os cortes na raça de Fernando e Álvaro Pereira, ciente de que a sua importância está ao mesmo nível dos passes com que ontem João Moutinho, acompanhado em grande parte do encontro por James, destroçou o processo defensivo do Guimarães, dando água pela barba, por exemplo, a Alex. Razões suficientes para o lateral-direito, por exemplo e não por penalização, ficar a pensar que mal terá feito a esses médios para tantas vezes conduzirem a bola para aquele lado, onde Álvaro Pereira e Varela reeditaram a ala de sucesso da temporada passada.
O Vitória de Guimarães obrigou o FC Porto à melhor exibição da época no Estádio do Dragão. Rui Vitória lançou um onze que da bancada de Imprensa se imaginou em 4x3x3, mas que em poucos minutos se percebeu, deixava Edgar sozinho contra Rolando e Otamendi, porque os aparentes extremos tinha mais ordens para ajudar a defender no meio-campo, afinal de contas, o modelo de jogo que garantira o triunfo, na jornada anterior, em Coimbra. Este desenho e estas preocupações exigiram ao meio-campo portista o tal misto de carregador de piano e pianista - Defour é e foi também um bom exemplo disso e talvez por isso titular, ao contrário da arte de Belluschi -, qualidade e profundidade de passe, lugares de comuns que ainda fazem do futebol um belo espectáculo.
Não houve Vitória no ataque até ao 1-0 dos dragões, devendo então esse mérito ser atribuído a um FC Porto a quem todos, antes do apito inicial, se referiam como órfão de Hulk. Quem? Exacto, não foi neste jogo que o brasileiro somou pontos como essencial, mas foi nestes 90 minutos que o Incrível deixou de ser o melhor marcador da equipa, ultrapassando nesse particular estatístico por James, engenheiro e operário dos golos que não deixaram a ansiedade tomar conta da equipa - o 1-0 surgiu aos 19 minutos - e que a afastou com o 3-1 aos 75 minutos. É que depois do 2-1, houve uma fase em que o V. Guimarães conseguiu confundir o FC Porto onde ele é mais vulnerável, o longo espaço que a pressão alta cria entre o meio-campo e o quinteto mais defensivo portista. Um risco de que Vítor Pereira não abdica e que, no outro lado do "cobertor", permite um sem número de roubos de bola dentro do meio-campo adversário. É aí que a dupla personalidade do FC Porto é mais notória, foi aí que o Vitória de Guimarães nunca foi capaz de se superiorizar, nem mesmo quando, por coincidência, as palmas (coisas de um passado comum) à entrada do experiente Pedro Mendes quase se confundiram com a monumental assobiadela que acompanhou o golo de Faouzi, também ele acabado de ser lançado no jogo. Assobios explicados pelo erro de julgamento do árbitro Hugo Miguel, que no mesmo minuto apitou à inglesa junto da área vitoriana - houve, de facto, falta de Anderson Santana sobre Varela - mudando para a habitual sinfonia portuguesa do apito num corte sem falta de Fernando nas imediações da baliza guardada por Helton. Um momento aproveitado pelo Guimarães para reduzir a desvantagem, o suficiente para abalar por alguns minutos um FC Porto que antes envergava com orgulho o fato de gravata, mas que teve de vestir a roupa de operário, reduzindo a pó as tentativas de ataque de um Vitória que ganhara mais qualidade com Pedro Mendes e velocidade com Faouzi.
Foi uma miragem esta melhoria dos vitorianos, até porque o pianista James voltou a reaparecer no jogo, desempenhando o papel que tantas vezes Hulk protagoniza: desequilibrar a balança, exactamente quando o adversário julga estar mais perto do que nunca de ser tão forte como o FC Porto. Ontem, sem Hulk, houve a melhor exibição da época e, ao contrário de outros bons jogos, três pontos a somar ao total azul e branco.
in "ojogo.p"
1 comentário:
Sem fazer uma exibição deslumbrante, o FC Porto de ontem já deu uma imagem mais próxima, daquilo que é capaz, para lutar pela revalidação do título. Terá sido, contra uma equipa de boa qualidade, uma das melhores exibições da época.
Gostei do desempenho geral dos atletas, especialmente de Moutinho (o maestro), Álvaro Pereira (uma seta do lado esquerdo), de Rolando (mostrou a Kléber como se marca à matador), de Fernando (como um relógio suíço), de Defour (muito consistente e lutador), de James (um prodígio, mas tem de ser menos intermitente), de Maicon (pela regularidade nas suas acções defensivas) e... da ressurreição de Varela (a prometer voltar à condição do jogador útil e importante que foi num passado recente).
Danilo estreou-se e mostrou pormenores de qualidade, mas eu queria vê-lo era no seu lugar de defesa-direito.
Um abraço
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