O "piccolo" Barros não se põe em bicos de pés. Sendo um dos treinadores com maior taxa de êxito a nível internacional, prefere manter-se na sombra, entre amigos, e a fazer aquilo de que mais gosta. Como jogar futebol, por exemplo...
Permita-me um cliché: vamos falar da sua altura. Quantas vezes isso foi assunto ao longo destes anos?
Muitas. Eu era, provavelmente, o jogador mais baixo a nível internacional. Para mim, falar-se sobre isso era um motivo para eu ser melhor e mais forte. Conseguir jogar àquele nível sendo tão baixo obrigava-me a ter algo de especial. Era mais rápido, mais esperto e mais vivo do que os outros, porque nos duelos perdia sempre. Tinha de espremer mais de mim, encontrar mais-valias...
Os baixinhos estão na moda. Isso fá-lo pensar que apareceu na altura errada?
Pois. Houve momentos em que ser grande é que era bom, mas no futebol há lugar para todos, temos lugares específicos, há zonas em que a agilidade e a rapidez são trunfos importantes.
Giovanni Agnelli, ex-presidente da Juventus, chegou a dizer que, depois de si, não queria mais jogadores baixos na equipa.
Foi uma frase muito polémica. Ele disse que da bancada VIP não me conseguia ver. Acho que foi uma brincadeira, porque em Itália gostaram muito de mim e fui importante para a Juventus.
Comprou muitos carros em Itália?
A Juventus tem a particularidade de ser da família que detém a FIAT. Quando assinei tive dois carros novos, um deles mais potente, a 50 por cento do preço. No final da época vendi-os mais caros e voltei a comprar outros dois a metade do preço. Ainda os trouxe, mas só me duraram mais dois anitos.
Com a taxa de sucesso que tem como treinador [três jogos, três vitórias e um título], por que tem deixado a carreira em suspenso?
Digo aos meus amigos que não é difícil ganhar três jogos. Vamos ver... Gosto de estar na observação, no futuro veremos.
É uma característica de personalidade?
Se calhar. Prefiro estar numa posição mais reservada. Não é o medo de falhar, mas o medo de assumir. Quando o fizer, terá de ser a sério. Não penso nesse dia.
Se pudesse acrescentar algum antigo jogador a esta equipa, de quem é que se lembrava?
Do Maradona. Era o meu ídolo, cruzámo-nos muitas vezes, eu na Juventus e ele no Nápoles. Era uma delícia vê-lo, marcou-me muito. Não éramos amigos, mas ele uma vez disse que eu tinha sido dos melhores jogadores a passar por Itália. Caiu-me bem.
Quando marcou na Holanda, ao Ajax, para a Supertaça Europeia, houve quem visse em si um novo Maradona. Pesou-lhe o rótulo?
Já no Varzim me chamavam o Maradona da Póvoa. Foi pela altura só. Não temos nada a ver. Eu era mais rápido, mas ele era melhor tecnicamente, mais forte no um-para-um, genial nos livres... Era em tudo melhor do que eu. Eu fui só mais um jogador.
Mas mais rápido do que o Maradona...
Atenção. Eu não era rápido de correr os 100 metros, era um rápido do futebol. Eu não queria correr 50 ou 70 metros depressa, mas fazer 10 ou 20 metros mais rápido do que os outros no momento. Em espaços curtos, era muito rápido e difícil de apanhar.
Voltando a Maradona, ele deve-lhe um título italiano, certo?
Sim. Marquei dois golos ao Milan, que estava a discutir o título com o Nápoles, e ganhámos 3-0, acho. Não era fácil, porque o Milan tinha uma superequipa e eram sempre a melhor defesa do campeonato. Aliás, quando há um Milan-Juventus ainda há jornalistas que me ligam para recordar essa história.
Como muitos outros, começou no futebol de salão...
Sim, sempre gostei. Comecei com sete anos, em escolas, adorava jogar em espaços reduzidos. Não sei se vou fazer a diferença, mas já não sou a mesma coisa.
Sempre teve camisolas à medida?
Quando ganhei estatuto passei a fazer o que queria e mandava cortar. No início era difícil, tinha de jogar sempre de manga curta, senão tinha de estar sempre a puxar para cima. E mesmo a manga curta era meia manga para mim. O número fixo foi uma grande invenção.
Longe da ribalta há tempo para tudo
O desafio foi lançado por diversas vezes, mas sempre rejeitado. Rui Barros, que fez parte das equipas técnicas de Jesualdo Ferreira no FC Porto, não quer ser treinador principal, o que não significa que esteja longe do futebol. No Dragão, faz parte da estrutura do scouting e cumpre horários. "Normalmente levo os meus filhos à escola e às 9h30 estou a picar o ponto. Faço relatórios, analiso jogadores e quando é preciso vou ao estrangeiro para uma observação mais profunda", resume. Rui Barros diz que nada lhe dá mais prazer do que trabalhar "entre amigos", partilhar almoços e histórias que o tempo não apaga.
Rui Barros
Idade - 46 anos
Carreira no FC Porto - De 1974 a 1980; De 1982 a 1989
Números no campeonto - 342 jogos; 318 golos
Títulos - 1 Taça Intercontinental, 1 Taça dos Campeões, 1 Supertaça Europeia, 5 Campeonatos Nacionais, 2 Taças de Portugal, 2 Supertaças Nacionais; 2 Botas de Ouro, 6 vezes melhor marcador
in "ojogo.pt"
Sem comentários:
Enviar um comentário