Terminada a primeira fase do Andebol 1 - regressa em Fevereiro para dar lugar aos trabalhos da Selecção Nacional -, uma conclusão é fácil de tirar: Gilberto Duarte é o grande jogador da prova. O JOGO foi conversar com ele.
Em 2007, com 17 anos, dizia que o objectivo era ficar no FC Porto e jogar. Quatro anos depois, ainda que apenas com 21 anos, está a fazer um campeonato extraordinário. Satisfeito ou queria mais?
Estou muito satisfeito. Era mais ou menos isto que sonhava: poder estar entre os melhores de Portugal e jogar ao lado deles, competir com eles e ganhar títulos e, neste momento, já ganhei três campeonatos e uma Supertaça. Mas espero ganhar muito mais.
A sua caminhada está ainda praticamente a começar...
Sim, é verdade, e a minha ambição cresce a cada momento. Quero muito mais do que isto, quero ajudar a minha equipa a chegar muito mais longe.
O que foi preciso fazer para se dar esta evolução nestes quatro anos?
Muito trabalho, muito apoio dos colegas e equipa técnica, sacrifício e muito sofrimento. Passei alguns momentos difíceis, por ter tido semanas de treino que não corriam bem, por haver momentos na escola que também não corriam bem. Por causa do andebol, e por precisar de algum apoio familiar e amigos e não o ter. Andei muitas vezes em baixo por causa disso.
O apoio que o Gilberto tem aqui no Porto vem basicamente da equipa?
Sim, embora já tenha feito alguns amigos aqui pelo Porto, normalmente são os colegas que me apoiam. Isto aqui é mesmo como uma família. Mas, mesmo. Não é dito por dizer. Aliás, se não fosse assim não éramos tricampeões nacionais. Se não fôssemos unidos, amigos, uma verdadeira equipa, não conseguíamos chegar aos títulos, pois há muito boas equipas que não ganham nada. É fundamental ter um bom grupo e isso aqui é mesmo assim. E esse grupo bom foi muito importante para mim.
Há quatro anos estava a começar e olhava para os mais velhos como referências, mas hoje em dia já são outros miúdos a olhar para o Gilberto como ídolo. Como encara isso?
Sempre que alguém me elogia, sinto uma grande felicidade, porque significa que estou a atingir os meus objectivos e que também estou a ser uma referência para os mais novos. Fico extremamente contente, mas quero continuar a trabalhar para evoluir e ser uma referência do meu clube, o Lagoa Académico Clube. Sempre que lá vou, sinto que me dão um grande afecto e fico contente por poder divulgar o nome do Lagoa por Portugal fora e até poder entusiasmar outros jogadores de lá e mostrar-lhes que é possível chegar a este nível.
Percebe-se que tem um grande orgulho nas suas origens, no Lagoa?
Tenho, muito. E nunca irei esquecer os tempos que passei no Lagoa. Comecei lá com nove anos e saí de lá com 16 para o FC Porto.
Como surgiu o andebol?
Primeiro, foi através do desporto escolar e, depois, foi por influência de amigos e do meu irmão que também jogava. Na altura também praticava karaté, tive de me decidir por uma delas e fui para o andebol. E não me arrependo nada [risos].
"Evoluí muitos nestes anos que trabalhei com Obradovic"
Trabalhou com Carlos Resende, que era uma referência para si. Agora está há três anos com Ljubomir Obradovic. Como é trabalhar com um técnico conhecido pela grande exigência e dureza do trabalho?
Evoluí muito nestes anos que trabalhei com Obradovic, que é muito bom treinador. O Carlos Resende também trabalha bem, mas Obradovic faz um trabalho diferente. Claro que no início, quando percebemos como ele trabalha fisicamente, pensámos: "Ei, então, o que se passa agora?". Mas no final da época tivemos os ganhos disso: termos sido campeões.
Queria ser central e hoje em dia pode dizer-se que é um primeira linha completo. Concorda?
Isso é um dos trabalhos que desenvolvemos com o Obradovic, ou seja, não há jogadores de postos específicos, todos temos de saber jogar nas três posições da primeira linha. Eu, o Wilson e o Mota vamos às três posições, o que me agrada muito. Sinto-me a evoluir a cada dia que passa.
"Não podia estar num clube melhor para aprender"
Tem muitas épocas de andebol pela frente. Quais são agora os seus novos sonhos?
Ser uma referência no FC Porto, que ainda não sou. Tenho de ter consciência que só tenho tempo de jogo porque o Wilson não está e eu, para chegar ao nível do Wilson, tenho de trabalhar e melhorar muito mais.
Mas acredita, então, que ainda há muito potencial para explorar?
Eu quero acreditar que sim, ainda tenho muito para aprender com o Wilson e o Filipe Mota. Se não conseguir aprender é porque o meu potencial parou. Mas aos 21 anos acho que não. Conseguindo isso, o sonho é jogar a nível internacional, na Liga dos Campeões, ter um lugar na selecção e ir a campeonatos do mundo e da Europa.
Uma das espinhas atravessadas no FC Porto é a Liga dos Campeões, que tem falhado...
É verdade, mas nós vamos chegar lá. Com trabalho, vamos chegar lá. E eu gostava de jogar a Liga dos Campeões pelo FC Porto até para fazer alguma coisa pelo clube, já que estou aqui desde menino. O que eu tenho e sou é graças ao FC Porto e não me ficava nada mal se pudesse jogar uma Liga dos Campeões pelo clube. Adoro estar aqui, é uma cidade fantástica, o clube tem uma excelente estrutura, foi uma aposta certa da minha parte. Não podia estar num clube melhor para crescer e aprender.
"À velocidade com que jogamos ninguém nos pára em Portugal"
Já falou de alguns sacrifícios, até de algum sofrimento, mas as estatísticas mostram que valeu a pena. O Gilberto é líder destacado do ranking do Jogador Mais Valioso (MVP) do campeonato.
Eu sei que isso é verdade, mas para já só me interessa a equipa. Quando tivermos os objectivos colectivos alcançados, aí acho que poderei pensar nisso.
Mas a equipa também dá sinais de estar bem. Lidera o campeonato, sofreu apenas duas derrotas.
Sim, está a seguir o curso normal, mas ainda falta muito campeonato. Os jogos que ainda teremos de fazer nesta fase e os dez jogos finais que serão muito importantes. Seja como for, para já, a única coisa que tem corrido mal são as lesões. Ainda não tivemos a felicidade de ter a equipa completa num jogo que fosse, faltou sempre um e jogadores como Dario, Moreira e Wilson Davyes são baixas de peso.
O FC Porto está na liderança, tem feito alguns resultados que não deixam dúvidas, bateu o recorde de golos num só jogo (48), o da maior diferença final (25 com 43-18). O que mais será o FC Porto capaz de fazer quando tiver a equipa completa?
À velocidade com que jogamos, ninguém nos pára em Portugal. Isto não é ser pretensioso, é a realidade. Jogamos um andebol muito rápido, muito forte, defendemos bem e fazemos contra-ataque, se depois acrescentarmos os três jogadores que faltam para ajudar na rotatividade, ninguém nos vai parar, pelo menos é nisto que acredito.
Mas o FC Porto já foi parado pelo Benfica, na Luz, e pelo Sporting, no Casal Vistoso...
Não somos os únicos que trabalhamos bem e vamos buscar bons jogadores. As outras equipas também se reforçam e começam a ganhar rotinas que os ajudam a combater-nos. Além disso, perdemos em casa deles, mas quando cá vierem... Por exemplo, o Sporting vai ter de nos defrontar e vai ser para a desforra, porque aquele jogo ficou atravessado.
Mas o Benfica esteve a ganhar no Dragão até aos 55 minutos, a jogar muito bom andebol e o treinador Jorge Rito queixou-se da arbitragem e da justiça do resultado, dizendo que o Benfica mereceu ganhar. O que lhe pareceu?
Foram duas equipas a jogar bom andebol, não foi só uma, mas um jogo acaba no minuto 60 e não no 55. Claro que não foi fácil. A equipa adversária não vai estar a fazer figura de corpo presente. Mas isso do mérito é relativo. Também há mérito em dar a volta a um resultado negativo ou não? Há dois anos, para a Taça de Portugal, também estivemos sempre à frente e apenas no último parcial fomos eliminados.
"Selecção? vou lutar para agarrar o meu lugar na primeira linha"
Imagina-se a jogar lá fora?
Muita gente já me disse que tenho potencial para chegar lá. Gostava de jogar no Kiel. Vou trabalhar para isso. Depois, no fim da carreira, logo se vê. Tenho tempo, agora há é que pensar no FC Porto e ainda tenho muitas coisas a ganhar aqui.
A Selecção A também é um espaço que está a conquistar aos poucos...
Para já ainda só estou a ver o que tenho ou não de fazer. Quando chegar a altura vou querer arranjar o meu espaço. Qualquer um sonha chegar à selecção.
Vai demorar a chegar essa altura? O que sente por ser convocado como ponta?
Espero que não demore. Mas isso depende de outros factores. Quando chegar a altura vou lutar para agarrar o meu lugar na primeira linha. É onde tenho trabalhado nos últimos cinco anos e onde me sinto bem. Se estou a fazer um campeonato inteiro na primeira linha, julgo que é lá que tenho de continuar na selecção. Mas respeito a opção do treinador, que acha que me deve levar para a ponta.
Perfil
Segundo de seis irmãos - Izenaida Catarina, Cláudia Sofia, Humberto, Samuel e Arménio são os outros cinco - Gilberto Duarte, de origem cabo-verdiana, nasceu em Lagoa, tendo optado pelo andebol aos nove anos em detrimento do karaté, depois de também ter experimentado ténis e futebol. Quando tinha 16 anos, José Magalhães, dirigente do FC Porto, desafiou-o a mudar-se para o Porto, e ele aceitou, embora só no ano seguinte tenha integrado os dragões.
Fez 21 anos em Julho, já conquistou três campeonatos e uma Supertaça. Diz que o croata Balic é o deus do andebol e agora admira o dinamarquês Mikel Hansen. Fiel às suas origens, gosta de comer cachupa (carne, milho e feijão) e, no Porto, vai muito à Picanha. Vê séries na televisão, ouve gothic-metal e recentemente descobriu o fado. Sendo fã de Ana Moura, confessou ter ficado triste com a morte de Cesária Évora.
Terminou o 12º ano e pensa entrar em Informática. Mas o que mais gosta mesmo de fazer é dormir... muito.
in "ojogo.pt"
Sem comentários:
Enviar um comentário