terça-feira, 9 de julho de 2013

Fonseca - entre a continuidade e a mudança- António Tadeia

Modelo. Dizer que o FC Porto jogo no mesmo sistema há vários anos é dizer uma verdade mas fugir ao essencial. Entre o FC Porto de Jesualdo Ferreira e as equipas de André Villas-Boas ou Vítor Pereira havia diferenças abismais, tão grandes como o talento de João Moutinho. Paulo Fonseca tem um desafio enorme pela frente: reconstruir.

Quando perdeu Hulk, Vítor Pereira perdia um atacante de top, de seleção brasileira, capaz de resolver um jogo numa arrancada, num remate potente, mas ao mesmo tempo perdia também um elemento disruptivo na sua organização coletiva. Já antes, quando o Incrível se lesionara, o treinador desdramatizara: “O Hulk acrescenta-nos qualidade individual, mas o FC Porto sem o Hulk não é fraco. Valemos pelo coletivo”, dissera. E os acontecimentos deram-lhe razão. Mas quando o rendimento de João Moutinho baixou, no início da Primavera, o FC Porto ressentiu-se. Porque Moutinho era a chave do coletivo do FC Porto desde a sua chegada ao Dragão, a razão pela qual, sempre no 4x3x3, uma equipa que era mais perigosa em transição se transformou numa equipa de posse e circulação. Nessa altura, com o coletivo a funcionar pior, teria dado jeito Hulk: é para isso que servem os elementos disruptivos. E esta constatação serve para se avaliar a dimensão da tarefa de Paulo Fonseca. O treinador que chega de Paços de Ferreira terá de construir um coletivo sem James, o substituto de Hulk na hieraquia de desequilibradores, e sobretudo sem João Moutinho.

Dizer que o FC Porto tem trabalhado em continuidade em cima do 4x3x3 desde os tempos de Mourinho é ver o futebol sob um prisma exclusivamente posicional e iludir a questão à volta das sucessivas reconstruções da equipa. O próprio Mourinho mudou de um ano para o outro, baixando linhas e tirando intensidade à pressão do onze que ganhou a Taça UEFA, em 2003, para o que venceu a Champions, em 2004. Mas basta atentar nos anos mais recentes para perceber as mudanças. Jesualdo Ferreira é um dos mais conceituados especialistas europeus em transições e gostava de ter a sua equipa a funcionar assim, metendo profundidade logo que possível no seu jogo. Daí que os jogadores-chave das suas equipas fossem sendo homens muito fortes neste tipo de futebol, como Lisandro López ou Raul Meireles – além de Lucho, que sabe fazer tudo, claro. A perda da Liga de 2010 para o Benfica e a chegada de André Villas-Boas ao Dragão coincidiu com a entrada de João Moutinho na equipa. E, apesar de ser um ás, por exemplo, na transição defensiva, as características de Moutinho faziam dele o homem-ideal para um novo conceito de jogo. O algarvio recrutado ao Sporting pensa rápido, passa bem, dá dinâmica e segurança à equipa e tem uma noção de ocupação de espaço que podia fazer dele o eixo de um onze a jogar sobretudo em posse, estimulando mais o momento da organização ofensiva.

Foi isso que fez Villas-Boas e a equipa disparou, ganhando Liga, Taça e Liga Europa. Vítor Pereira manteve as bases da organização coletiva, aperfeiçoou-as até, após a saída de Hulk, e continuou a ganhar internamente. Simplesmente, com a saída de Moutinho, do que se trata agora é de mudar a ideia. Para o lugar do jogador vendido ao Mónaco, os dragões foram buscar o mexicano Herrera, que já disse ser capaz de dar à equipa “a largura de jogo” que lhe dava Moutinho, querendo com isto dizer que podia funcionar como diretor de orquestra, como elemento de ligação no tal futebol de posse, que leva a bola aos dois flancos em cada jogada. Herrera é um médio versátil, bom organizador, que joga normalmente como segundo elemento do duplo pivot (que o FC Porto não usa há anos), mas que pode atuar também como 10 ou até como médio-ala. É, nesse aspeto, um jogador mais parecido com Lucho González que com João Moutinho. Além de que é um jogador acabado de chegar da América Central e pode ser o cúmulo do otimismo esperar que se repita o fenómeno de adaptação instantânea que se viu, por exemplo, com Jackson Martínez.

Jackson, aliás, teve muito mérito na forma como chegou e se integrou de imediato, rendendo golos desde a estreia, mas estava a entrar numa máquina oleada onde o que se lhe pedia era o acabamento. Herrera está mais atrás no processo criativo: se vem ocupar a vaga de Moutinho, o que se lhe pede é que puxe alavancas e empurre rodas dentadas, algo mais complicado de conseguir no imediato por quem chega a um clube e a um país novo. É por isso que Paulo Fonseca terá pela frente uma tarefa tão difícil. Porque também ele chega agora a um grande e nos primeiros dias terá de decidir o que quer: continuidade sem o principal garante de estabilidade coletiva, perdido no mercado para o Mónaco, ou mudança de uma estrutura que ganha há três anos sem parar. A resposta surgirá com os primeiros jogos a sério.

Saque
Cassano fustigou-se ontem: diz que deve a si próprio uma grande carreira, por nunca ter dado mais do que 30% do que podia dar, se se esforçasse. Aos 30 anos, ainda vai muito a tempo. Ao contratá-lo sem ter de pagar pelo passe ao Inter de Milão, o Parma pode estar a acertar no jackpot. Ou a enfiar um grande barrete.

Pechincha
O Mónaco não compra tudo acima do valor de mercado. A prova é a aquisição de Toulalan ao Málaga: pagou, ao que se diz – que os números ainda não são oficiais – cinco milhões de euros por um médio-defensivo que, apesar dos seus 29 anos, valerá o dobro, é francês e encaixa na perfeição com Moutinho.

Oportunidade
20 milhões de euros são uma soma avultada para se dar por um médio de equilíbrios, como Paulinho. Mas Paulinho é titular da seleção brasileira, foi um dos destaques na Taça das Confederações e faz golos como um autêntico segundo atacante. Parece-me que o Tottenham não vai arrepender-se.

Barrete
Michael Laudrup não costuma enganar-se, mas a sua especialidade em Inglaterra é a contratação de espanhóis, mais baratos que a mão-de-obra local. Paga cinco milhões de euros por Shelvey ao Liverpool. OK, é um internacional sub-21, mas em três épocas no Liverpool nunca conseguiu afirmar-se.

Desastre
Quando um treinador começa a aparecer nas notícias pelas más razões, é sinal que está a acabar a carreira. Quando ainda assim a notícia é o montante da indemnização recebida, é também sinal que não precisará de trabalhar muito mais. Camacho perdeu por 5-1 com a Tailândia, foi despedido pela China e leva 6,4 milhões de euros.

TOP 10
As transferências mais caras do Verão
JOGADOR DE PARA VALOR*
Falcao At. Madrid Mónaco 60
Neymar Santos Barcelona 57
James Rodríguez FC Porto Mónaco 45
Fernandinho Shakthar Manchester City 40
Götze B. Dortmund Bayern 37
Isco Málaga Real Madrid 30
João Moutinho FC Porto Mónaco 25
Schürrle Leverkusen Chelsea 21,5
Navas Sevilha Manchester City 20
Kokorin D. Moscovo Anzhi 19
*Valor em milhões de euros 


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