quinta-feira, 5 de março de 2015

Walter Paz, zero minutos no FC Porto: «Nos amigáveis rendi sempre»

Argentino lembra passagem efémera por Portugal, depois de se ter destacado no Mundial 91. «Plantel era bom, mas eu tinha condições para jogar», garante


Walter Paz na seleção portuguesa? «Fizeram-me o mesmo que ao Messi»DESTINO: 90's é uma rubrica do Maisfutebol: recupera personagens e memórias dessa década marcante do futebol. Viagens carregadas de nostalgia e saudosismo, sempre com bom humor e imagens inesquecíveis. DESTINO: 90's.  
 
WALTER PAZ: FC Porto e Gil Vicente (1994/95) 
  
Xavi e Iniesta. Rui Costa e Batistuta. Costinha e Maniche. João Pinto e Jardel. Walter Paz e Mogrovejo. 
  
O mundo do futebol cria, muitas vezes, ligações fortes entre jogadores, fazendo com que seja muito fácil passar de um a outro em conversas de café. A origem das ligações pode ser díspar e no caso que, agora, nos interessa, há um rótulo que os liga: contratação falhada. 
  
Desta feita, vamos separar Walter Paz de Mogrovejo e ficar apenas com o primeiro. Argentino, médio ofensivo, destacou-se na pobre seleção das Pampas que esteve em Portugal no Mundial Sub-20 de 91. Três anos depois voltou de malas feitas para ficar. Aterrou no Porto e tornou-se dragão. Saiu sem ter feito um único jogo oficial. 
  
Foi preciso ir quase até ao fim do mundo para encontrar Walter Paz. Aos 43 anos, está em Calafate, no sul da Argentina. Treina uma equipa local, o Lago Argentino, e é coordenador dos professores de desporto na Escola Municipal. Atende o telefone e não esconde a surpresa. 
  
«De Portugal? E querem falar comigo? Bem, confesso que estou surpreendido», atira entre risos. De facto, Walter Paz não está habituado a receber telefonemas com indicativo lusitano. «Quase nem joguei aí», insiste. Não é modéstia. É verdade. 
  
Maisfutebol começa…pelo início. Bom caminho, quase sempre. Como veio, então, Walter Paz parar a Portugal? 
  
«Estava no Argentino Juniores e o FC Porto mandou cá o próprio Bobby Robson para ver-me jogar. Ele gostou e disse para me contratarem. Tinha outra proposta do Feyenoord, mas entre Portugal e Roterdão não pensei duas vezes», explica. Os dragões já o conheciam do tal Mundial Sub-20, onde foi dos poucos a fazer-se notar entre os argentinos. 
  
Desse torneio guarda recordações agridoces:«Futebolisticamente não correu muito bem, mas para mim não correu mal. Joguei, joguei bem até.» 
  
Robson quis ver pelos seus próprios olhos e gostou. O problema é que, sente Walter Paz passados vinte anos, o saudoso técnico inglês enganou-se. 
  
«Infelizmente não cheguei a jogar no FC Porto, só na pré-temporada. Não foi só culpa minha. Não sei o que aconteceu. Não sei se havia dinheiro envolvido. Não tenho muito claro o que se passou», começa por dizer. 
  
Perante a insistência, admite que não encaixava no perfil que Bobby Robson pretendia. «Fiquei com ideia que foi tudo decisão dele. Já viu? Foi ele que me contratou e foi ele que não me deixou jogar. Não era um jogador comunitário, também me prejudicou. Mas sei que a direção não me queria deixar sair», explica. 
  
«O problema foi o Bobby Robson. Tinha outras ideias. Joguei só amigáveis, mas rendi sempre. A direção queria que eu ficasse porque viam isso, mas o treinador não me achava importante. E não se pode dizer que correu mal: foi campeão. Como contrariar isso?», diz, entre risos. 
  
Ficar no Porto sem jogar deve ter sido complicado para alguém que procurava construir uma carreira, tentamos adivinhar. Walter Paz rebate: «Vou ser sincero: não foi um drama. Estava fora do meu país e não estava a jogar, claro. Mas a cidade era muito linda, o clube era muito bom comigo, sempre falei bem com toda a gente e tenho boas recordações. Grandes recordações. Poderia ter sido melhor, mas às vezes as coisas não acontecem como queremos.» 
  
«Parece que ainda os estou a ver: tem calma Walter, espera um pouco» 
  
Quando se apercebeu que não entrava, definitivamente, nas opções de Robson, Walter Paz pediu à direção para sair. Mantinha uma boa relação com a direção, bateu-lhes à porta e explicou a situação. Pensou que seria fácil, mas o clube, confessa, ainda acreditava nele. 
  
«Queriam que ficasse mais tempo, mas eu queria sair. Era novo, queria jogar. Foi decisão minha. Parece que ainda os estou a ver a falar comigo: ‘tem calma Walter, tem calma. Espera’. Se calhar se o inglês [Bobby Robson] saísse eu poderia jogar. Mas na altura eu não pensava nisso. O plantel era muito bom mas eu tinha condições para jogar»,insiste. 

De facto, o FC Porto tinha boas opções para o miolo, na altura. Emerson, Kulkov e Paulinho Santos, mais defensivos. Rui Barros, Semedo, Latapy, mais ofensivos. Ainda os já veteranos André e Jaime Magalhães. Vida difícil para Walter Paz, em suma. 
  
A solução chamou-se Gil Vicente. «Fui para lá para jogar mais. Os presidentes tinham uma boa relação e foi a solução. Eu aceitei porque assim poderia mostrar a minha qualidade em Portugal», frisou. 
  
Ao chegar a Barcelos apercebeu-se que o clube não tinha nada a ver com o FC Porto e o choque foi evidente: «Era uma diferença muito grande. O clube tinha poucas condições, não tinha campo de treinos, sequer. Posso dizer que conheci os dois extremos em Portugal: o bom e o mau.» 
  
«Defendi sempre as cores do clube, joguei, marquei golos, mas não era o que queria para mim. Fui para Portugal para um clube importante, rejeitei o Feyenoord e, com todo o respeito pelo Gil Vicente, queria mais», comenta. 
  
Contas feitas, fez oito jogos e um golo pelo Gil, que valeu uma vitória sobre o Marítimo. Só duas vezes foi titular. No início da época seguinte, 95/96, foi emprestado ao Hurácan, regressando à Argentina. Pouco depois cessou a sua ligação ao FC Porto. 
  
«Rescindi, foi tudo assim meio escondido. Segui o meu caminho. E o FC Porto continuou a ganhar. E ainda bem, só desejo bem ao clube», remata. 
  
«Quem é o presidente do FC Porto? Ainda o Pinto da Costa?!» 
  
Waltez Paz não esconde no discurso o respeito pela instituição que lhe abriu as portas da Europa. Teve outra experiência: duas temporadas no Dundee, da Escócia, entre 1996 e 98. 
  
Do tempo em Portugal, recorda a surpresa à chegada.«Honestamente, conhecia muito pouco do FC Porto. Na Argentina não se sabia nada mais do que o normal, que era um clube grande em Portugal. Agora sim, aqui acompanha-se mais o futebol português, pelo menos quem está mais por dentro do futebol. Na altura os jogadores saíam daqui para Itália ou Espanha. Ninguém ia para Portugal», explica. 
  
«Fiquei surpreendido com o clube. Muito organizado, uma grande estrutura, bons campos para treinos, um estádio bonito», elogia, ainda falando do, agora, inexistente Estádio das Antas. 
  
Saiu de Portugal em 1995 e nunca mais voltou até hoje.«Creio que encontraria um FC Porto muito diferente, não? Notava-se que era um clube e uma cidade em crescimento», explica. 
  
E faz, ele próprio, uma questão: «Quem é o presidente agora? Pinto da Costa?! Ainda? (risos) Muito bom, muito bom.» 
  
Voltando ao início desta história, ficou-nos a dúvida. Então e Mogrovejo? Walter Paz é perentório: «Nunca mais o vi». 
  
«Não tenho nada a ver com ele. Ele veio, ficou um mês, rescindiu e foi embora. Não tenho qualquer contacto com ele, sei que acabou a carreira muito cedo, nada mais», conclui.   

Walter Paz na seleção portuguesa? «Fizeram-me o mesmo que ao Messi»

Um mito que se criou face às raízes lusitanas do argentino. «Portugal era a terra dos meus avós», conta

WALTER PAZ: FC Porto e Gil Vicente (1994/95) 
  
Walter Paz candidato a internacional…português? Parece mentira. E é mentira. Uma espécie de mito que se criou e que ganhou repercussão na internet. É fácil encontrar em várias páginas dedicadas ao jogador essa referência, mas não há memória de que tenha havido qualquer tentativa de naturalização. E o mais certo é que não tenha havido mesmo. 
  
O motivo de todo o imbróglio é fácil de explicar. Walter Paz é descendente de portugueses. Aliás, como o próprio contou ao Maisfutebol, esse foi um dos motivos para ter escolhido o FC Porto na hora de sair do Argentino Juniors, quando também tinha proposta do Feyenoord, da Holanda. 
  
«Portugal é a terra dos meus avós. Os meus avós eram do Algarve, no norte do país. Sul? Isso, no sul, no sul (risos)», conta Walter Paz, agora com 43 anos, ao nosso jornal. 

  
O tema da seleção portuguesa é que surpreende o médio.«Não sei se isso é verdade», atira entre risos, novamente. Depois lá acrescenta: «Se calhar, se calhar…Eu não me lembro, mas já passou tanto tempo.» 
  
«Não falaram comigo, isso é certo. Mas acho que pelo que fiz em Portugal também não ia convencer ninguém», brinca.
  
E dá ainda outro exemplo curioso para encerrar o tema: «Já tinha jogado na seleção sub-20 da Argentina, acho que não podia, de qualquer forma. Olhe, fizeram-me o mesmo que ao Messi (risos). O Pekerman fez grande jogada: levou-o aos sub-17. Se não a esta hora era espanhol.» 
  
«Sou mais conhecido por Pescadito do que por Walter» 
  
Walter Paz não guarda qualquer contacto em Portugal. Criou laços de amizade com alguns jogadores do FC Porto e do Gil Vicente, lembrando que fazia «muitas viagens de autocarro» até Barcelos com colegas que também moravam na Invicta. 
  
«No FC Porto tinha uma boa relação com o Jorge Costa e o guarda-redes. Como se chama? Vítor Baía? Isso. Era muito bom ele. Foi tudo muito rápido, não deu para criar grandes amizades», sublinha. 
  
O laço mais forte terá sido criado com o próprio clube.«Sempre me trataram muito bem. Passados muitos anos, já nem tinha ligação ao clube, continuavam a mandar-me um postal de parabéns pelo correio no meu aniversário», conta. 
  
Mais à frente na conversa lembra-se de outro amigo. « O Rui Jorge!», atira, sem aviso. Como? « O Rui Jorge também era meu amigo. Foi o meu colega de quarto num torneio de pré-temporada que fizemos em Inglaterra», explica. 
  
E se no campo das amizades as escolhas não são vastas, falando de jogadores que o impressionaram, Walter Paz atira vários, sem hesitar. 
  
«Lembro-me que o Figo, do Sporting, era o grande jogador português da altura. No FC Porto havia o Aloísio, o central, que gostava muito. Também o russo…Kulkov. Muito bom no meio campo. E ainda treinei com o búlgaro, o Kostadinov. Depois ele saiu para o Corunha, mas do que vi parecia-me um jogador de grande qualidade», descreve. 
  
Estava na hora das despedidas, mas deixámos uma última pergunta a Walter Paz, o «Pescadito». A alcunha que o tornou famoso na Argentina foi pouco explorada em Portugal. Vem de onde? 
  
«Foi um amigo do meu pai mas nunca soube bem porquê. Vem já dos quatro, cinco anos. É um mistério. Mas aqui sou mais conhecido por Pescadito do que pelo meu nome», remata. 

in "maisfutebol.iol.pt"

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