"Pode não ter sangue azul como André Villas-Boas, mas tem sangue vareiro e também chegou lá acima" - é assim que alguns amigos espinhenses de Vítor Pereira enaltecem o valor do treinador, que veio do anonimato até à elite do futebol. Conforme explicou a O JOGO um empresário próximo do técnico, que preferiu não ser identificado, Vítor Pereira "não atingiu o que sempre quis pelos conhecimentos no futebol ou pelo passado como jogador, mas sim pela confiança, trabalho e competência que foi demonstrando por onde passou".
Natural de Espinho, Vítor Pereira, de 42 anos, formou-se no clube local como jogador e depois passou por pequenos emblemas como Estarreja, Fiães, Avanca e Lobão, entre outros. Médio polivalente - jogava a 8, 6 ou 10 - terminou a carreira precocemente e, sempre ligado às raízes, jogou futebol popular nos Leões Bairristas, um clube do Bairro Piscatório de Espinho. Um percurso discreto, mas que não impediu Vítor Pereira de atingir o topo como treinador, o seu principal objectivo em termos profissionais. "Sempre acreditou nas suas capacidades", conta o mesmo empresário.
Vítor Pereira mergulhou nos livros, licenciou-se em Educação Física na Universidade do Porto e foi-se especializando no treino. Em 2009, por exemplo, concluiu o curso UEFA Pro (Nível IV) em segundo lugar, com 17,9 valores, só superado por Bruno Moura, actual treinador do Santa Clara (18 valores).
"Sempre foi um estudioso do futebol. Aparecia aqui com livrinhos e tabuleiros para estudar tácticas no cantinho dele", revela António Oliveira, proprietário de um café onde Vítor Pereira é cliente assíduo e amigo do técnico. Aliás, há quem o considere um "viciado em futebol", e há uma história que encaixa aqui como uma luva: quando dava aulas de Educação Física numa escola secundária de Santa Maria da Feira, função que acumulou com a de treinador até ir para o Santa Clara, Vítor Pereira aproveitava qualquer "furo" para se resguardar numa sala e rabiscar o quadro com sistemas tácticos.
Quem saiu a perder desta vez foi a família, à qual Vítor Pereira é bastante dedicado - tem três filhos -, privada da sua companhia rumo às férias, embora por um bom motivo. Um imprevisto de sonho para Vítor Pereira, que vai treinar aquele que sempre foi o seu clube do coração.
Pedro Sousa
"É uma fera a trabalhar"
Adjectivos como "competente" ou "exigente" são os que O JOGO mais ouviu quando foi à procura de um retrato de Vítor Pereira, um técnico que apoia grande parte do seu trabalho no aspecto científico, por exemplo na forma como analisa exaustivamente o adversário para tentar prever as suas reacções durante o jogo. "É um bicho no campo, uma fera a trabalhar. Mas também reconhece os amigos e sabe ser divertido", sublinhou Pedro Sousa, director técnico do Santa Clara, com quem Vítor Pereira trabalhou durante duas temporadas. Técnico com ideias claras em relação ao jogo, o espinhense gosta de actuar em posse e que a equipa assuma um jogo onde cada um conhece as suas funções e as movimentações colectivas. Fã do estilo Guardiola, o técnico do FC Porto é avesso a "mind games" e evita a polémica. "É um líder. No balneário, todos lhe reconhecem competência na forma como gere o grupo e fala com os jogadores", frisou Pedro Sousa. Ainda com um currículo limitado a passagens pelo Arrifanense como adjunto, Vítor Pereira foi técnico principal da Sanjoanense e do Espinho antes de treinar o Santa Clara, na II Divisão. "Acredito que muita gente deve estar de pé atrás, mas ele vai surpreender com o seu trabalho. Tenho a certeza de que vai dar muitas alegrias ao FC Porto", acrescentou o dirigente.Rua 18 em delírio
BRUNO CABRALVítor Pereira foi o tema mais recorrente das conversas de ontem na sua cidade natal e deixou as gentes de Espinho orgulhosas pelo estrelato atingido pelo conterrâneo. Algo que foi mais notório na rua 18, onde o técnico viveu durante vários anos e onde hoje residem familiares muito chegados, como a mãe e os sogros. Não admira, por isso, que por aquelas bandas se tenha vivido um momento inesquecível quando, ao final da tarde, Vítor Pereira subiu ao palco do Auditório José Maria Pedroto, no Estádio do Dragão, para ser apresentado como treinador do FC Porto.
O Café Benidorm, onde o novo timoneiro dos dragões é cliente assíduo, foi o palco da primeira explosão de alegria. Foi ali que a mãe de Vítor Pereira, a dona Lina, como é conhecida por todos, assistiu à conferência de Imprensa do filho lavada em lágrimas. "Chorei muito de felicidade", confessou à reportagem de O JOGO em passo acelerado, enquanto era cumprimentada pelos vizinhos. "Minha senhora, parabéns!" - dizia um jovem adepto do FC Porto do outro lado da rua, ao mesmo tempo que duas senhoras encostavam o carro ao passeio e buzinavam para agraciar a progenitora do sucessor de André Villas-Boas. "Agora, toda a gente me conhece", soltou às gargalhadas.
Sempre simpática e bem disposta, admitiu entre risos ser "uma fala-barato" e fez um desabafo: "Eu já andava desconfiada, mas ele não me dizia nada. Eu sentia que ele ia para um lado [com Villas-Boas para o Chelsea] ou para o outro [treinador principal do FC Porto]". Confirmou-se a segunda hipótese e não havia forma de esconder o orgulho. "Tenho um filho que é uma maravilha, uma brasa", brincou.
Num tom mais sério, a mãe de Vítor Pereira teve um depoimento que diz bem do sonho que sempre comandou o técnico espinhense. "Desde pequeno que ele quis ser treinador. Sempre me disse que ia estudar não para dar aulas mas sim para treinar. E quando ele mete uma coisa na cabeça é incrível", garantiu.
"Há muito tempo que achava que ele ia chegar longe", sublinha António Oliveira. Domingos Rio, amigo e vizinho da rua 18, onde tem um minimercado, destaca o lado humano de Vítor Pereira. "É reservado, muito humilde, amigo do amigo, uma pessoa correcta", refere este ex-colega de turma do novo técnico do FC Porto. "Aos 13/14 anos, não via nele um futuro treinador, mas via nele alguém que ia chegar longe independemente da área", acrescenta Domingos Rio.
Os amigos esperam hoje por Vítor Pereira para lhe darem um abraço e desejar boa sorte para este novo desafio.
Muitos conhecem-no apenas por "Tá"
Vítor Pereira passou a ser conhecido pelo verdadeiro nome apenas quando se tornou treinador. Até então era somente o "Tá" ou "Vítor Tá". E ainda hoje é assim que os espinhenses mais próximos se referem a ele. Uma alcunha com muitos anos e que ficou a dever-se ao irmão do técnico. Em pequeno, Nuno não conseguia pronunciar o nome Vítor e das várias tentativas (entre as quais "Vitá") resultou este curto e curioso baptismo.
in "ojogo.pt"
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