Alfredo Quintana, em Março, foi o primeiro chegar. Meses mais tarde veio Daymaro Salina. Formam a dupla de cubanos do FC Porto, num mercado que hoje está ligeiramente mais acessível, após o acordo de cooperação selado entre as federações portuguesa e a do país caribenho, que faz com que os atletas vindos daquela ilha não sejam considerados estrangeiros. O Sporting também já ali "pescou" Francis Carol e Yailan Hechavarria.
"Comecei a jogar na escola", conta Quintana. "Estive primeiro no básquete, mas o professor saiu e, entretanto, o meu irmão Eduardo levou-me para o andebol. Fui fazer as provas e fiquei. Comecei por jogar a lateral-esquerdo, mas um dia, numa competição, faltou um guarda-redes e pedi ao professor para ir para a baliza e ali fiquei até hoje", recorda. Pelas suas palavras percebe-se que em Cuba o desporto é basicamente escolar. Não há clubes. "Quando temos aí uns 12 anos vamos para a escola de alto rendimento de jovens. Todos os miúdos da cidade, os maiores, vão para lá", explica o guarda-redes do FC Porto, revelando que subiu "de categoria com 15/16 anos", chegando então à selecção nacional. "Fui para a equipa nacional júnior, onde só fiquei um ano, depois fui logo para a selecção principal, tinha 17 anos."
Daymaro é um pouco mais tímido, deixa Quintana comandar a conversa, mas lá disse como surgiu o andebol. Adivinhe… "Foi igual, também comecei na escola. É assim com toda a gente. Depois passei à escola dos melhores juniores e com 18 anos cheguei à selecção nacional A". Quantas internacionalizações tenho? 53, acho", responde. Quintana tem menos. "Tenho 37. Ele foi a algumas competições que eu não fui", justifica.
É precisamente na selecção que se fazem as carreiras desportivas em Cuba. "A competição é por província - cidade de Havana, Matanzas, Cienfuegos - mas apenas dura uma/duas semanas. Na maior parte do tempo estamos concentrados na selecção e se algum país vai lá jogar, competimos, se não treinamos entre nós", conta Quintana.
Sendo assim, como é que os clubes europeus os descobrem? Quintana conta como o FC Porto chegou até ele: "Foi através de um amigo meu, Rafael da Costa, que joga em Espanha. O professor [José] Magalhães falou com ele, ele falou-lhe de mim e o contacto estabeleceu-se. Depois o professor Magalhães foi ver-me ao Panamericano no Chile, gostou e a coisa fez-se." Já Daymaro, foi "através do Quintana", como seria de esperar.
As saídas é que foram difíceis, como são todas as de Cuba. "Em Cuba é tudo complicado. Tudo mesmo, mas lá se consegue. Claro que gostamos do nosso país e temos saudades da família, dos amigos, mas lá as coisas são complicadas", remata Quintana, com a anuência de Salina.
"Já sabíamos que não podíamos voltar a jogar na selecção"
Tanto Quintana como Salina estavam conscientes de que ao sair do país não voltariam a jogar na selecção. Uma situação que não lhes agrada, mas que compensa. "Já sabíamos que não podíamos voltar a jogar na selecção, mas mesmo assim é melhor para nós sair. A nossa carreira tem mais possibilidades de crescer, de evoluir, tendo mais competição", explicam os dois atletas. "Claro que para a selecção seria melhor ter jogadores com mais rodagem, com outra experiência, com outro tipo de competição, mas são questões políticas e é assim há muitos anos." De resto, não faltam exemplos de excelentes jogadores cubanos, que estão em grandes equipas europeias e não representam a selecção: Rolando Urios, Julios Fis, Carlos Reinaldo e Rafael da Costa, isto além do falecido Vladimir Rivera.
Festa com carne, feijão, arroz, cerveja e rum ... muito rum
Também há árvore de Natal, o nascimento de Jesus também se celebra e "só as crianças recebem uma prendita", explica Quintana. De resto, "come-se porco assado com congris [arroz com feijão preto, n.d.r.]", e, em vez de vinho e champanhe, "bebe-se cerveja e rum", revela Daymaro.
Trata-se de uma celebração bastante diferente: "Lá o Natal começa a festejar-se no dia 18 e acaba lá para 5/6 de Janeiro. É beber, beber e beber. Bebe-se cerveja e rum, muito rum", diz Quintana. "Claro que se trabalha na mesma, mas as pessoas passam esses dias assim. Então no Ano Novo é espectacular. Às 5 da manhã ainda há pessoas a comer porco assado no meio da rua", explica o guarda-redes.
Quintana passou o Natal junto da família, já Daymaro, por questões burocráticas, não teve essa possibilidade. "Fui a casa do Sérgio Rola [colega de equipa]. Já tinha provado bacalhau e lá comi outra vez", confidenciou, ainda que não escondendo alguma tristeza por não poder ir a casa.
Frio é o pior de Portugal
Perfeitamente adaptados ao Porto, os dois atletas cubanos identificam facilmente a maior dificuldade que têm de suportar. "O frio. Aqui é mesmo muito frio", ri Quintana, perante a aprovação de Daymaro, que lhe junta uma dificuldade própria de quem tem menos tempo no país: "A diferença horária também me fez confusão", referindo-se às cinco horas a mais em Portugal.
De resto, garantem gostar muito da cidade. "Foi o Alfredo que andou a mostrar-me algumas coisas", diz Daymaro, com o guardião a especificar: "Vamos aos restaurantes, aos shoppings, às discotecas, mas só quando não temos jogos. Também vamos junto ao rio tomar uma cervejinha ao domingo à tarde."
Quintana chegou e mostrou qualidade
Há muito tempo que o FC Porto tentava a contratação de Alfredo Quintana, em quem José Magalhães, director-geral do andebol, depositava muitas esperanças. Chegou ao Porto em Março deste ano e o primeiro jogo que disputou foi em Resende, com o Sporting da Horta, fazendo nove defesas em 24 remates.
Poucas semanas depois fazia a primeira grande exibição em Portugal, em Braga, frente ao ABC, numa vitória importantíssima dos dragões rumo ao tricampeonato, com 15 defesas - espectaculares 58% de aproveitamento - , sendo cinco a livres de sete metros. Com Quintana, internacional A cubano a fazer dupla com Laurentino, internacional português, a baliza do FC Porto está muito bem guardada.
Daymaro Salina bem a defender e a atacar
As primeiras qualidades de Salina foram mostradas na defesa, onde o FC Porto, com a saída de Inácio Carmo, estava a revelar dificuldades em acertar o seu afamado e produtivo 6:0. No entanto, com o passar dos jogos e cada vez mais adaptado, Daymaro Salina começou a ter mais tempo de jogo. As transições rápidas para o ataque foram a segunda grande revelação. O cubano é rapidíssimo, o que é essencial no estilo de jogo veloz imposto por Ljubomir Obradovic. Finalmente, mostrou ser completo no posto de pivô, com o técnico sérvio a poder dar descanso a Tiago Rocha e... minutos a Daymaro. Para exemplo servem bem as últimas partidas: com o Belenenses marcou oito golos em 11 remates (6 em seis aos seis metros) e contra o Xico fez sete em sete (três aos seis metros).
in "ojogo.pt"
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