sábado, 4 de fevereiro de 2012

Caio: "Adeptos não perdoam se perdermos com o Benfica"

Caio é pragmático. Não está para rodeios, nem com espírito para clássicos. A morte do pai de Filipe Santos abalou toda a equipa e despertou o lado mais existencialista do avançado. Antes de falar do frente-a-frente mais esperado da época e que ontem à tarde já esgotara os bilhetes no Dragão Caixa, o jogador justificou-se: "Infelizmente recebemos uma notícia triste, que afectou um certo clima de euforia em torno do jogo. Mas, de alguma forma, é bom para percebermos que a vida não se resume a isto, que são apenas 50 minutos de um jogo em que estão três pontos em disputa."
O clássico surge à 14ª jornada e "não tem qualquer outro ingrediente" que não seja o facto de opor "o primeiro contra o segundo". Esta é a visão simplista do jogador, que aos poucos vai revelando um pouco mais: "Preparámos o jogo como todos os outros: de forma séria. Sabemos que, principalmente para os adeptos, é especial porque nos perdoam todas as derrotas menos contra o Benfica. Mas nós temos de ser mais racionais e saber que estão três pontos em jogo. Não o vemos como um jogo decisivo. Queremos vencer e dar mais um passo rumo ao principal objectivo, que é sermos campeões. Temos de nos alhear da envolvência, porque esta pode criar um certo deslumbramento e não podemos achar que o jogo está ganho antes de terminar."
O discurso de Caio alinha pelo de Filipe Santos, capitão portista, e até de Valter Neves, capitão do Benfica, que, nas vésperas do grande jogo, mostraram contenção nas palavras e até alguma reverência. "Nesta altura do campeonato percebemos que este jogo, qualquer que seja o resultado, não irá ser decisivo. Normalmente, os campeonatos ganham-se e perdem-se contra equipas mais fracas", defendeu com convicção.
Num percurso de 13 jornadas [ndr: um jogo subtraído com a exclusão do Porto Santo SAD], se os dragões deram a sensação de uma caminhada tranquila, o Benfica foi demonstrando mais dificuldades. Caio até pode concordar, mas, num tom cortez, recusou avaliações: "Nós não andamos a fazer comparações com ninguém. Acreditamos numa estratégia que até agora tem dado resultado."
Com velocidade nas transições e uma forte dinâmica posicional, o FC Porto é a melhor equipa do campeonato - "pelo menos é o que diz a classificação", anota Caio -, estatuto reconhecido pelos próprios adversários, como confidenciou o avançado: "Já me disseram: 'Parece que vocês são mágicos. Onde está a bola têm de estar lá dois jogadores nossos'. E é, de facto, algo difícil de contrariar. Exige um plantel de oito jogadores ao mesmo nível. Isto provoca um desgaste físico e psicológico porque, mais minuto menos minuto, as equipas acabam por quebrar pelo facto de estarmos sempre em cima do lance. Tem sido um dos trunfos da nossa equipa."
O maior desses trunfos foi oferecido de bandeja pelo Benfica, quando logo na primeira jornada foi a Braga empatar, ficando a dois pontos dos dragões. A equipa da Luz é agora posta à prova pelo decacampeão, mas terá a última palavra em Junho, pois, na segunda volta, joga em casa.


Segredo da força está na camisola

No final de 2008/09, Caio trocou o FC Porto pelo Benfica, onde esteve duas épocas, voltando este ano ao clube onde foi quatro vezes campeão. Conhece a realidade da Luz e do Dragão e sabe bem o que os distingue: "É possível ter uma equipa bem orientada, mas se faltar a entrega de disputar o lance como se fosse o último, não chega." Então, o que define o FC Porto? "Uma enorme ambição, intensidade de jogo, valor individual e o somatório de tudo é o que forma um colectivo muito forte.", respondeu Caio. Mas, existindo a possibilidade de o Benfica partilhar as mesmas qualidades, qual a diferença entre ambos? "Como todas as equipas, temos fraquezas, que tentamos superar com garra e companheirismo e nos últimos anos isso tem sido suficiente para ganhar ao Benfica."
A união de uma equipa, com menos apoio a nível nacional do que o rival da Luz, parece traduzir-se na mística de que todos falam. Caio não é excepção e, num exercício que considerou "difícil", explicou quem esteve nos dois lados: "Com esta camisola sentimos que não há ninguém melhor do que nós e que defrontamos qualquer adversário em qualquer lado. Sentimos que temos tudo para ganhar e fazemos de tudo para ganhar. Isso sente-se quando se está no FC Porto e quando se sai. Passei por vários clubes [Gulpilhares, FC Porto, Barcelos e Benfica] e sinto isso."

"Vitória permite-nos depois ter um dia menos bom"

Nem todas as recomendações de Tó Neves podem ser reveladas. Mas há, pelo menos, uma que Caio pode partilhar. "O treinador disse que temos de impor a nossa condição de anfitriões e criar uma margem de protecção para o restante campeonato. Se ganharmos ficamos com cinco pontos de vantagem, o que nos permite ter depois um dia menos bom." Como depois do clássico se segue uma deslocação aos Açores, Caio admitiu: "Acho que, no ano passado, foi o jogo dos Açores que decidiu o campeonato e, neste momento, se ganharmos os dois jogos [Benfica e Candelária], será muito difícil depois perdermos seis pontos durante o resto do campeonato. Essa é a mensagem que passa entre nós." Se atingirem esse objectivo, os dragões entrarão invictos na segunda volta do campeonato, a 18 de Fevereiro.

"Tó Neves dá-nos total liberdade"

No regresso ao FC Porto, Caio já não encontrou Franklim Pais no banco. Tó Neves é o novo treinador e Caio aprova: "Tem superado as minhas expectativas. Dá-nos total liberdade para decidirmos no momento, mas também nos cobra." Apreciador do estilo de Tó Neves, deixou escapar: "Gostava de ter jogado com ele, porque as lacunas enquanto jogador eram colmatadas com a raça, entrega e querer. Contagiava a restante equipa. Gostava de ter podido captar essa energia." Num gracejo, concluiu: "Joguei contra ele. Tenho aqui uma lembrança [dedo que partiu]."

"Estou feliz por voltar"

A passagem pelo Benfica não agradou aos adeptos, mas estes já esqueceram. De águia ao peito era alvo de cânticos insultuosos, agora é acarinhado como dantes. "Não me sentia magoado. Achava que era normal. E aconteceu-me, depois do jogo, cruzar-me com pessoas que me tinham insultado duas horas antes e falávamos normalmente. Saí a bem e a pensar que um dia gostaria de voltar a casa. Ainda bem que aconteceu. Estou feliz por isso. Quando vinha à cidade, cruzava-me com pessoas que diziam que gostavam de me ver outra vez no FC Porto."

"Benfica vale pelo colectivo"

FC Porto e Benfica ainda não se defrontaram esta época. É com dois reforços que a equipa de Luís Sénica se desloca ao Dragão, onde também residem novas apostas (Tiago Santos, Nélson Pereira e Tó Neves). Sérgio Silva "leva experiência e o Carlos López o hábito de ganhar tudo", garantiu Caio, com a mesma certeza que acrescentou: "Temos de ter cuidado com a irreverência dos jogadores mais jovens". Afinal, Caio acredita que "o Benfica vale pelo seu colectivo", mas também se apressou a esclarecer: "Estamos atentos".

in "ojogo.pt"





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