Portista desde o berço, Jorge Costa estava a um ano de se
transferir do Foz para o FC Porto, mas ainda não tinha projetos
para ser futebolista profissional. Anos depois, haveria de ligar o nome
à história do clube, tendo erguido na qualidade de
capitão de equipa uma Liga dos Campeões, umaTaça
UEFA e uma Taça Intercontinmental.
Onde é que estava no 27 de maio?
Em casa, na Foz, a ver o jogo pela televisão. Morava num
bairro onde 99 por cento dos habitantes eram portistas. Quando acabou o
jogo viemos todos para a rua festejar. Era o primeiro título
internacional do FC Porto, conseguido noutro contexto. Não havia
crise, as pessoas eram mais felizes. Foi um momento de grande alegria.
Depois fui para a Avenida dos Aliados, com mais dois colegas. Eu levava
vestida uma camisola do Zé Beto, que era de um colega meu. Era
verde. Andámos a noite toda a festejar.
Recorda algum jogo especial da campanha para Viena?
Recordo-me especialmente de quando fomos ganhar a Kiev, por 2-1. Era
novito mas lembro-me perfeitamente. Foi a primeira grande alegria.
Aquele era o jogo-chave, até porque o Dínamo era uma das
melhores equipas do mundo e a base da seleção da
União Soviética.
Em que momento é que percebeu que era portista?
Portista sou desde que me lembro. Os clubismos têm a ver com
influências familiares, principalmente dos pais. Depois vai-se
ganhando a paixão. As minhas recordações
são sempre azuis e brancas.
Que loucuras cometia pelo FC Porto enquanto adepto?
Nunca fui de grandes loucuras. Ia sempre ver os jogos às
Antas e lembro-me de um FC Porto-Barcelona que ganhámos por 3-1,
com três golos do Juary e o Archibald marcou o deles [6 de
novembro de 1985]. Chovia a cântaros e já não me
lembro se tive problemas com os meus pais, mas quando cheguei a casa
não havia peça de roupa que escapasse.
Não tendo feito parte daquele plantel de 1987, o que acha que
herdou daquele grupo e que se refletiu na sua carreira de jogador?
Não fiz parte daquele plantel mas ainda tive o prazer de
jogar com alguns dos campeões europeus de 87. Não tenho
dúvidas de que foi o ponto de viragem. O que custa é a
primeira vez, é provar que se é capaz. A partir dessa
vieram mais seis: a Champions, duas Intercontinentais, a Taça
UEFA, a Liga Europa e a Supertaça Europeia.
Tinha a imagem de duro e continua a ser considerado um exemplo, "um jogador à Porto". O que é isso, afinal?
A história de ser um jogador à Porto e a
mística são coisas um bocado subjetivas. Eu era um
jogador à Porto porque era assim, tudo em mim era natural. Era
um jogador sério, honesto e pronto a dar tudo pela equipa. O
jogador à Porto não pode ser forçado, porque para
mim isso significa ser natural e estar pronto a defender uma causa.
Como chegou a herdeiro da braçadeira de João Pinto?
Foi no tempo do António Oliveira. Acho que tudo na vida
acontece de forma natural, mas quando o João [Pinto] saiu,
senti-me honrado por herdar a braçadeira, porque havia no
plantel jogadores com mais anos de clube, como o Domingos, o Folha, o
Aloísio, o Paulinho Santos ou o Rui Jorge. Os
responsáveis, juntamente com o técnico, entenderam que eu
tinha características de liderança para poder capitanear
a equipa e passar a imagem do que é ser Porto, um exemplo dentro
e fora do campo. Foi um motivo de grande orgulho.
No percurso de 2004, quando é que acreditou na conquista da Champions?
Para nós não era um objetivo de temporada, mas a
partir de determinada altura passámos a achar que era
possível. Mudou tudo em Manchester. Antes era um sonho e ter
expectativas é sempre positivo. A partir do golo do Costinha
passámos a acreditar que o nosso momento tinha chegado.
Essa vitória não começou a ser programada com a vitória da Taça UEFA, em Sevilha?
Sevilha deu-nos a maturidade europeia que qualquer equipa precisa
de ter. O percurso até Sevilha foi muito engraçado, pela
forma como se formou o plantel e porque vínhamos de um ano mau.
Nessa época, e em especial depois dessa conquista[Taça
UEFA] ficámos com a certeza de que com trabalho e
dedicação tudo é possível. Não digo
que nos tenha feito acreditar que um ano depois ganharíamos a
Liga dos Campeões, mas alimentou o sonho.
Queria ser veterinário
Jorge Costa, a quem um dia Fernando Couto chamou Bicho, e o nome
pegou, era portista, jogava futebol no Foz e futebol de 5 no bairro,
mas ainda não sabia se a bola teria ou não
importância na vida futura. Estudava na Escola Secundária
Garcia de Resende, em frente ao Estádio do Bessa, e prestava
mais atenção aos livros. "Acho que vivia o dia a dia sem
sem muitas preocupações. Dedicava-me aos estudos e
projetava ser veterinário. Pensava mais nisso do que em ser
profissional de futebol." Depois, a roda da vida girou e o FC Porto
ganhou um capitão histórico e o futebol português
um jogador de referência, ele que adorava a equipa de 1987, a
arte de Futre, os golos de Gomes, "uma verdadeira equipa de artistas e
trabalhadores" e tinha uma predileção especial por
Madjer. "Há 25 anos fazia coisas que hoje vemos fazer Messi e
Cristiano Ronaldo. Se jogasse agora estaria ao nível deles. Era
um dos melhores do mundo."
in "ojogo.pt"
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