Sir Dave Richards, presidente da Premier League durante catorze anos, em entrevista ao Maisfutebol
Sir Dave Richards foi presidente da Premier League durante catorze anos: entre 1999 e 2013 liderou a a transformação que tornou a liga inglesa na melhor do mundo e em 2006 foi condecorado pela rainha pelos serviços prestados ao futebol.
Nesta entrevista ao Maisfutebol o antigo dirigente fala da perceção que existe do futebol português, onde, reconhece, se fala em demasia dos árbitros: o que dá à liga nacional uma carga muito negativa. Pelo caminho critica os fundos e defende a Liga dos Campeões.
Leia tudo.
Qual é a ideia que existe em Inglaterra do futebol português?
A perceção que temos é que... é apenas mais uma liga europeia. Sempre houve aqui grandes jogadores e por isso há um certo respeito pelo futebol português.
Referia-me à organização do futebol português: que ideia existe da Liga?
Bem, eu sei que em Portugal a conversa anda sempre à volta dos árbitros e de suspeitas de corrupção. Mas quem lança suspeitas, tem de as provar. Vocês têm de atacar essas suspeitas, caso contrário nunca conseguirão acabar com esse lado negativo do futebol.
E como se ataca isso?
Acho que aí é sobretudo um trabalho da Liga e da Federação juntas. É preciso proteger os árbitros. Nós, por exemplo, parámos com as suspeitas quando tornámos os árbitros profissionais e passámos a pagar-lhes bem.
A profissionalização devia ser um caminho?
Sim. Sem dúvida.
Mas a profissionalização não vai terminar com as conversas: em Portugal todos os presidentes, todos os treinadores, todos os jogadores falam de árbitros antes e depois dos jogos. Os adeptos discutem cada decisão até ao último pormenor...
Pois... Em Inglaterra não é permitido falar de árbitros.
Porquê?
Porque é totalmente errado. Se toda a gente começar a falar dos árbitros antes dos jogos, é uma pressão inaceitável. Isso é totalmente errado. Não pode acontecer. Em Inglaterra não é permitido nem antes nem depois dos jogos.
Aqui dizem que isso é condicionar a liberdade de expressão...
Liberdade de expressão? Tudo bem, se querem liberdade de expressão podem tê-la. Falem do jogo. Mas não critiquem o árbitro em público. Não critiquem o espetáculo, não critiquem o adversário, não critiquem o presidente e não critiquem o treinador em público. Não é permitido, ponto final. Se o fizerem, vão ser punidos e multados. Acima de tudo tem que haver respeito pelo jogo.
Como é que se faz para um liga europeia não ser um espaço de luta pelo poder?
Não sei. Nós em Inglaterra temos o que chamamos «Os fundamentos de uma liga profissional» e todos os clubes têm de assinar esse documento. Ninguém pode quebrar o código de conduta. Se quebrar, vai ser punido. Os regulamentos obrigam todos os membros da direção a ser independentes. Não pode haver pessoas do Liverpool, do Manchester United, de nennum clube na presidência, na direção executiva ou na direção.
Mas você foi presidente da Sheffield Wednesday...
Sim, fui. Mas demiti-me, tornei-me independente e só depois fui presidente da Premier League. A única coisa que tinha nessa altura era a experiência do jogo.
A Liga dos Campeões proporciona-nos todas as semanas, ou quase todas as semanas, verdadeiros jogos de all-stars. Isso não vai matar as ligas nacionais?
Não vai matar as ligas nacionais. A Liga dos Campeões já existe há tanto tempo... Só vai tornar os grandes clubes maiores. Por causa do dinheiro que gera.
Mas os pequenos clubes também vão ficar mais pequenos...
Não, os pequenos clubes vão continuar pequenos. Não vão ficar mais pequenos.
Mas como é que podemos esperar que as pessoas continuem a ir ver um Leicester-Hull City, quando pela televisão se habituam a ver um Real Madrid-Manchester City e um Barcelona-Bayern Munique com os melhores jogadores do mundo?
Um adepto vai ser um adepto do seu clube até ao fim, mas ao mesmo tempo também é um adepto do futebol. Por isso gosta de ver um Manchester City-Real Madrid. Ver o Real Madrid, o Barcelona ou o FC Porto não torna os adeptos piores: torna-os melhores.
O fim da partilha dos fundos de jogadores não vai apenas beneficiar os grandes clubes de Inglaterra, França e Alemanha?
Não, pelo contrário: os fundos é que não beneficiam nenhum clube. Só beneficiam o próprio jogador e o próprio fundo. Nós já banimos os fundos em Inglaterra. Não se sabe de onde vem o dinheiro, os fundos não respeitam regras porque ninguém sabe quem são e os clubes não beneficiam destas parcerias. Os fundos não fazem sentido no futebol.
in "maisfutebol.iol.pt"
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