Podia usar estas primeiras linhas para enfatizar desalmadamente o pior ciclo de resultados de Jorge Jesus em três temporadas no comando do Benfica - quatro jogos consecutivos sem ganhar (três derrotas e um empate) -, mas puxar muito por essa ponta do novelo seria apequenar o mérito da equipa do FC Porto e do seu treinador na forma como deu a volta ao clássico e meteu três pontos no bolso, disparando na liderança do campeonato e, com isso, anestesiando uma onda vermelha que, antes da visita a Guimarães, parecia imparável. Além de golos, lesões, cartões (amarelos, a vários, e um vermelho, a Emerson), habilidade tática, risco, emoção e ruído, o grande embate da 21ª jornada reuniu todos os ingredientes que se cozinham nos jogos de ponta. Houve cambalhotas no marcador, a primeira assinada pelo Benfica, a segunda (e irreversível) protagonizada pelo FC Porto; e polémica, também houve polémica, nomeadamente na jogada que resolveu o encontro, com Maicon a romper um fora de jogo milimétrico para bater Artur pelo ar e sentenciar um triunfo que o campeão fez por justificar e, mais ainda, procurou com inteligência e controlo emocional. Fundamental nesta conquista foi James. El Bandido chegou tarde à concentração portista por causa de obrigações a que não se pôde furtar na seleção da Colômbia, mas bem a tempo (58') de juntar inspiração à transpiração coletiva, sobressaindo neste particular, porém, a dinâmica, o coração e capacidade física e tática do triângulo do meio-campo: Fernando, João Moutinho e Lucho. O arrojo tático de Vítor Pereira - que teve como ponto alto a entrada de James (por Rolando) e a consequente recomposição do onze - fez o resto, é verdade.
Sagaz e tranquilo na abordagem ao clássico, o FC Porto, plantado num 4x3x3 que tinha Maicon na direita da defesa, impressionou nos primeiros minutos e logo quis explorar uma das fraquezas do Benfica: a vulnerabilidade de Emerson. Ao primeiro duelo com o lateral, Hulk sacou o tiro para o golo inaugural. A festa prematura era apenas um sinal da abordagem positiva do campeão, que fazia uma circulação de bola segura, à largura, mas também com progressão. Aimar, desta feita na pele de segundo avançado do 4x4x2 versão Champions, era abafado pela cobertura e movimentações de Fernando e Moutinho, enquanto Lucho, uns metros à frente, pressionava e dificultava a saída de bola. Com El Mago tapado, o Benfica deixava-se barrar pela cortina portista, não conseguia perfurar nem construir, e, sem bola, era envolvido pelo futebol calmo e assertivo de uma equipa que se apressou a expor que estava na Luz para fortalecer o primeiro lugar no campeonato. Nolito, no seu estilo furão, esforçava-se por agitar a equipa e arrastá-la para a área contrária, zona onde Cardozo, indiferente à vizinhança que o cercava, acenava, insistia e rogava por bolas diretas. E depois de praticamente colocar Aimar ao lado do Tacuara e ditar o adiantamento de Witsel, o Benfica, a fechar o primeiro tempo, teve a fortuna do seu lado, não apenas pela carambola que acabou no pé esquerdo de Cardozo (44'), mas também pelo desperdício anterior de Janko (36') - com Artur a brilhar - pelo pequeníssimo erro de cálculo de Moutinho num livre direto (38') que abanou a trave de raspão.
Segunda parte, os mesmos onzes, mas o FC Porto reentrava meio adormecido. De bola parada (48'), Aimar descobriu Cardozo nas costas da falha de interceção de Otamendi, e o goleador do Benfica cumpria a missão. Estimava-se que, em vantagem, e logo a seguir munido do veloz Rodrigo no lugar de Aimar (lesionado), a equipa de Jorge Jesus poderia servir-se das transições rápidas para assumir uma preponderância que não tivera até então no clássico. Foi... tiro na água. Emerson continuava a tremer à esquerda e obrigava a dobras - numa das vezes, Maxi teve de correr desde a direita para safar uma investida dos portistas. E foi nesta altura que Vítor Pereira promoveu a entrada de James e deu um valente murro no relvado, pondo-o a favor das suas cores. O 2-2, já com o FC Porto reconfigurado - sem Rolando, mas com Djalma enfiado na lateral direita - teve muitíssimo de James, na condução e finalização, mas também muito de Fernando, na recuperação e no apoio para a combinação. Emerson? Ainda andava por ali, mas pôr-se-ia de fora aos 77', após derrubar Hulk. A expulsão do lateral encolheu o Benfica - Gaitán recuou para fechar o setor - e foi o derradeiro convite para a vitória, que haveria de sair do pé esquerdo de James e, por acidente ou ironia, ser autenticada um minuto depois de Vítor Pereira juntar mais lenha (Kléber) à fornalha do ataque.
E, de cadeirão no Minho, o Braga esfregava as mãos: o segundo lugar está à distância de uma vitória...
in "ojogo.pt"
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