segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Do efeito placebo à poção mágica

Expostos os males que, em Barcelos, pareciam condenar o FC Porto à morte lenta e agonizante de todas as suas esperanças nesta época, era hora de avaliar se as imediatas contratações de Lucho e Janko eram remédio santo ou um simples fármaco a que os dragões reagiriam mais pela crença do que pelas suas propriedades terapêuticas.
A dúvida não estará totalmente desfeita no que a Janko diz respeito, mas a verdade é que o austríaco conseguiu em pouco mais de uma hora aquilo que Kléber procura há já oito jogos. É de terras gaulesas, porém, que chega a poção mágica que ameaça resgatar a equipa da inconstância, dando-lhe ritmo, inteligência e, não menos importante, golo.
De Lucho, basta-nos a ilustração do jogador que pegou na equipa pelos colarinhos, insinuando que jamais chegou a deixar o FC Porto. Sem nunca perder o seu estilo cerebral, quase científico, de quem não dá um passo em falso, o argentino reclamou a batuta, geriu e distribuiu, acelerou e travou. Mostrou à equipa como quer que ela jogue, engrandeceu Moutinho e deu asas a Danilo, um reforço que sai finalmente da redoma para nos lembrar que, afinal, pode haver uma réplica de Álvaro Pereira à direita.
É certo que estamos a retirar conclusões de um jogo da Taça da Liga e contra um V. Setúbal que só ganhou por uma vez nos últimos 13 encontros oficiais, mas a nova ordem no FC Porto permite extrapolações que vão muito para além da pobreza franciscana que foi a exibição contra o Gil Vicente. Sem preciosismos, Vítor Pereira percebeu a urgência de respostas, mandou os processos de adaptação às malvas e meteu a carne no assador.
Com oito caras novas face ao onze que foi atropelado em Barcelos, o dragão pôs à prova o meio-campo que vai durar até final da temporada, ensaiou a dupla de centrais para a recepção ao Leiria e deu-se ao luxo de voltar a ter lateral-direito. Danilo e Alex Sandro projectaram a equipa pelas faixas, criando situações para cruzamento que a referência Janko parece aconselhar.
E se esta largura é útil, agradável foi perceber a dinâmica da dupla Lucho-Moutinho, que encontrou quase sempre os apoios adequados e os ângulos certos para triangulações que permitiram à equipa comer linhas e encontrar rotas para o golo com passes de ruptura que desequilibraram os centrais sadinos.
Em tudo houve Lucho, naquela omnipresença que desgasta mais o adversário do que o próprio argentino, sempre de cabeça levantada, em passo constante e sem ponta de suor que espelhe o tanto que dá a equipa. Pensar-se-ia que, aos 31 anos, El Comandante fosse apenas a miragem de um tempo que já foi, mas quem augurou um défice de pernas ou de pulmão esqueceu-se que é com o cérebro que Lucho joga.
Essa frescura de ideias esteve quase sempre presente, por muito que a equipa tenha depois acusado alguma falta de entrosamento nas alas e a natural dificuldade de comunicação com um ponta-de-lança que acaba de aterrar num futebol distinto e numa equipa que ainda está habituada a pensar num outro perfil de homem de área.
O V. Setúbal cerrou fileiras com um onze replicado do da última jornada da Liga (só mudou três caras), muito mais preocupado em limitar os danos do que em concretizar as possibilidades matemáticas que ainda tinha de seguir em frente. Bruno Ribeiro debate-se com carências profundas e o FC Porto foi capaz de as expor sempre que deixou a bola correr, desequilibrando marcações.
O golo de Lucho, porém, vincou a certeza do resultado, limitando o atrevimento dos dragões, que se desvaneceu quase por completo quando Janko assinou o 2-0. De uma assentada, Vítor Pereira ganhava um lugar nas meias-finais da Taça da Liga e, muito mais do que isso, confirmava que tem cartas para o que resta da temporada e um líder que une as pontas e define a identidade colectiva.
Janko dificilmente escalará a montanha que são os golos de Falcao, mas Lucho trouxe luz a um FC Porto que parecia condenado a viver na sua própria sombra.

in "ojogo.pt"

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