Longa se torna a espera quando o golo chega ao 22º remate. Só ao 22º remate. As ameaças inquietam, o atraso aflige, as más notícias aparecem sempre mais depressa do que as boas. Seja como for, o desassossego do F.C. Porto foi sanado por Jackson. A tempo da equipa reaprender a sorrir.
O mal dos dragões terá sido esse. Pressionados por duas derrotas consecutivas, entraram em campo sisudos, incapazes de sentir prazer com o toque da bola. Quiseram resolver tudo depressa, mas a questão revelou-se mais intrincada do que se esperava. A paciência virou impertinência, a ambição transformou-se em desespero e o medo instalou-se até ao pontapé número 22.
O F.C. Porto foi sério e honesto. É bom que isso fique claro. Mas não foi capaz de decidir bem. Minuto após minuto, segundo após segundo, aumentou a pressão sobre o Moreirense e aumentou a pressão sobre si mesmo. A dada altura deixou de ser capaz de respirar e pensar.
O relógio virou-se ao contrário, o tic-tac passou a contar de trás para a frente, como se houvesse uma bomba relógio pronta a explodir nas mãos dos bicampeões nacionais. Não era caso para tanto.
Os maus resultados são potencialmente contagiosos. Uma espécie de Ébola no organismo das equipas. A lógica encontra jurisprudência em vários casos. O F.C. Porto, letrado e informado, teve consciência disso e passou a assustar-se com a própria sombra.
Pontapé após pontapé, Jackson e James, Moutinho e mais Jackson, a bola não entrava. Por vezes de forma escandalosa, outras por mérito de Ricardo Ribeiro e ainda mais por uma questão de sorte ou apenas futebol.
Os lances repetiam-se e por trás de cada movimento pressentia-se o espetro de um serial killer. Todos estes instantes sugeriam perigo, golo, sangue, e todos terminavam como se fossem uma brincadeira de Carnaval. Pistolas a esguichar água, facas de plástico a enrugarem-se, arco e flecha de brincadeira.
A somar a todo este mundo de aventuras inócuas, a lesão de Lucho. Vítor Pereira inovou e lançou o menino Kelvin. Um brinca na areia entusiasmante, mas com muito por provar. Juntou-se ao coro de avisos e desperdício, ao conjunto de boas intenções e remates ao lado.
Depois apareceu Kléber e o dragão passou a ter dois pontas-de-lança, com James a passar de extremo a dez e de dez a extremo.
O Moreirense sobrevivia, é certo, mas em sofrimento. Olhava para cima e via pendurada sobre si a espada de Dâmocles. O fio que a sustinha era fino, quase transparente e a qualquer instante rasgava-se.
Aconteceu ao minuto 71, ao 22º remate. Tantas tentativas frustradas, tanto receio acumulado, até ao cabeceamento do colombiano-mor, señor Jackson, após canto de James Rodríguez. Era preciso tanto? Não, naturalmente que não. A rever, a evitar, se o F.C. Porto quiser ser o que já foi este ano.
Longa se torna a espera, de facto, quando a aflição atrapalha o talento se mascara.
in "maisfutebol.iol.pt"