sexta-feira, 24 de junho de 2011

Mais Mourinho que Villas-Boas

Para um jogador de futebol só há uma dificuldade quando se é treinado por José Mourinho. Qual? Quando se deixa de trabalhar com ele. Micael Simão Pedrosa, mais conhecido por Micas, jogou no Leiria na época de 2001/02, quando o Special One começava a desenhar a alcunha, e desde aí conheceu a sensação algumas vezes. Menos uma, quando jogou no Espinho, na época de 2005/06. Porquê? Porque Vítor Pereira era o treinador. "Nessa época voltei a ter a alegria do treino. A organização da equipa e do trabalho, mais as diferenças nos pequenos detalhes, tudo era muito bom. Depois de trabalhar com Mourinho um jogador torna-se mais exigente. Nota-se a diferença quando se trabalha com outro treinador. Mas com Vítor Pereira não notei nada".
Micas, 30 anos, actualmente no Pombal, não tem medo do exagero que a comparação traz. Tirando o pequeno-grande pormenor da colecção de títulos do treinador do Real Madrid, este defesa que também pode jogar a médio garante que os métodos dos dois treinadores são mesmo muito parecidos, mesmo que as personalidades sejam opostas. Contou o extinto "Comércio do Porto" que quando Vítor Pereira se apresentou no Espinho, na tal época de 2005/06, disse que tinha a escola de Mourinho. A cerimónia decorreu nos Bombeiros Voluntários da cidade e toda a gente pensou que o treinador estava a meter água. Passados seis anos, Micas diz que não. Mas também podia ter dito na altura. "O Vítor Pereira é um treinador muito próximo dos jogadores. É extremamente metódico e faz a diferença. No início da semana já sabíamos todos os pormenores relativos ao adversário que íamos defrontar. Sabíamos tudo deles. Preocupa-se com a sua equipa e quer que ela se sinta entrosada, que o colectivo saiba o que está a fazer, mas nunca descura o adversário. E não era fácil estudar os adversários das divisões inferiores", conta Micas.
Depois de ter trabalhado com Vítor Pereira e José Mourinho, a conclusão do médio é esta. "Comparo-os nos métodos de trabalho e na relação próxima que mantêm com os jogadores. Vítor Pereira é muito exigente com os jogadores e não tenho dúvidas de que seguirá o mesmo caminho de sucesso percorrido por Mourinho. Mas são treinadores com personalidades diferentes". No Espinho, na tal época de 2005/06, os jogadores até tinham um nome especial para o agora treinador do FC Porto: chamavam-lhe Vítor Mourinho. "Por vezes dizíamos isso na brincadeira. São muito idênticos".


A táctica

Dois sistemas

Vítor Pereira já foi um fundamentalista táctico. Foi no início da carreira, mas cedo percebeu que tinha de adaptar a táctica aos jogadores em vez de tentar o contrário. O sistema preferido é o 4x3x3, mas há um alternativo. Micas conta como é. "Usámos muitas vezes o 4x3x3, mas também o 4x4x2. Dependia dos jogos. O Vítor Pereira tenta perceber como é que o jogador se sente bem em termos tácticos. Há uma adaptação mútua entre treinador e jogador e, para tal, a comunicação entre eles é muito importante".

A preparação absoluta

Cartas ou vídeo jogos são passatempos comuns entre os jogadores. Vítor Pereira não os proíbe, mas impõe algumas regras. Por exemplo, à medida que se aproxima um jogo é exigida concentração máxima. "Ele não gostava que jogássemos cartas se o jogo estivesse próximo. Na véspera não há problema, mas no dia do jogo, não. A preparação para a competição começa no estágio", conta Micas.


O treino 

Competitividade extrema

O treinador do FC Porto gosta de sessões de trabalho intensas. Duram entre uma hora e meia e duas horas e são encaradas com todo o profissionalismo. Ainda assim, há espaço para algumas brincadeiras, que no fundo são um disfarce da competição, de acordo com Micas. "Há muita competitividade e todos treinam no máximo. Mas, mais para o final da semana, quando os treinos são menos exigentes do ponto de vista físico para não haver sobrecarga, costuma haver apostas nas peladinhas. Um euro ou dois era quanto tinham que pagar os jogadores que perdiam. Depois íamos jantar". Vítor Pereira também dá muita atenção ao "treino individualizado e táctico". Aliás, essa era uma das suas funções na época passada.

Micas

"Por alguma razão Villas-Boas quis levá-lo para o Chelsea"

Micas não tem dúvidas de que Vítor Pereira vai ter sucesso no FC Porto, um clube ideal para treinadores com pouca experiência nos grandes palcos competitivos. "Vão tentar colar o trabalho de Vítor Pereira ao de André Villas-Boas, algo normal, mas ele saberá diferenciar-se. O Vítor Pereira é um treinador inteligente e com ideias próprias. Agora vai ter a possibilidade de fazer um bom trabalho num clube conhecido por ter uma estrutura excelente. A competência e a determinação são duas características essenciais que Vítor Pereira possui", disse o médio do Pombal.
O treinador do FC Porto, de 42 anos, nunca trabalhou no primeiro escalão do futebol português. O mais perto que esteve foi quando o Santa Clara, em duas ocasiões, falhou a subida de divisão. Nada que atrapalhe a convicção de Micas. "Parte do sucesso de André Villas-Boas deve-se a Vítor Pereira. Por alguma razão, o Villas-Boas quis levá-lo para o Chelsea", afirma.
Villas-Boas utilizou muito o lado motivacional, dando palestras emotivas e, segundo os jogadores, decisivas para o sucesso. Apesar de ter uma personalidade mais recatada, Vítor Pereira também aposta na mesma receita. "Ele sabe espicaçar o orgulho dos jogadores. Fala individualmente quando é necessário e tem um lado humano excelente. Por exemplo, no Espinho houve um jogador, o André Cunha, que passou uma semana complicada por causa do pai e ele uniu completamente o grupo em torno dessa causa". De acordo com Micas, Vítor Pereira também gosta de manter uma relação próxima com os jogadores. "A abertura entre treinador e jogador é grande. É como se fosse um amigo, com quem podemos conversar sobre todos os temas".

Vítor Frade

"Vive, respira e pensa futebol 24 horas por dia"

O FC Porto vai continuar a jogar um futebol atractivo e dominador. A garantia foi dada a O JOGO por Vítor Frade, professor de Vítor Pereira na Faculdade de Ciências do Desporto e da Educação Física do Porto (FCDEF) e, por isso mesmo, uma das vozes mais autorizadas para falar daquilo que se pode esperar do novo treinador portista. Vítor Frade, que na condição de adjunto de Bobby Robson, também deu as boas vindas ao FC Porto a André Villas-Boas, não tem dúvidas em usar os mesmos adjectivos que atribuiu ao actual treinador do Chelsea há cerca de um ano numa conversa com O JOGO. "Como disse há um ano, o talento, o verdadeiro talento, só precisa de uma oportunidade. O André teve a dele, e agora é a vez do Vítor que é um talento com um potencial tremendo", sublinhou, considerando a sua escolha para o cargo de treinador principal dos campeões nacionais "lógica para o clube, e a sequência natural para uma carreira em crescendo".
Vítor Frade foi o responsável pelo desenvolvimento da "Periodização Táctica", um método de treino que consiste em distribuir no tempo a aquisição de comportamentos inerentes a uma forma de jogar concreta, com o subjacente arrastamento das dimensões técnica, física e mental, que José Mourinho, André Villas-Boas e Vítor Pereira seguiram, embora com adaptações às ideias e conceitos de cada um.
De resto, o actual treinador do FC Porto "sempre se destacou" durante o tempo passado no FCDEF sublinha Vítor Frade. "É um daqueles treinadores que vivem, respiram e pensam futebol 24 horas por dia. É um grande talento que só estava à espera de uma oportunidade como esta para explodir" frisa Vítor Frade que augura o melhor para o novo treinador portista. "Tem todas as condições para ter sucesso e dar continuidade ao trabalho que tem sido realizado desde há vários anos pelo FC Porto", concluiu.

in "ojogo.pt"

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