domingo, 15 de setembro de 2013

FC Porto-Gil Vicente, 2-0 (crónica)

FC Porto 2 0 Gil Vicente (REUTERS)Sem sufoco nem heróis. Sem instantes inesquecíveis ou forças sobrenaturais. Este FC Porto é tão fiável, tão equilibrado, que joga de relógio na mão e lápis atrás da orelha. Sabe ser superior em todos os capítulos e lê cada período com a gentileza de um cavalheiro enamorado.

Investiga, identifica, pune e retrai-se. Tudo perturbadoramente natural e previsível, ao nível da mais domingueira comédia romântica. O Gil Vicente vergou-se ao 2-0, como podia ter-se vergado a outro resultado, mais ou menos dilatado. Estava tudo previsto no guião azul e branco.

O dragão gere as contas imbuído de um pragmatismo familiar, como se isto do futebol não fosse mais do que um pequeno negócio geracional. Neste caso, é evidente, não podemos desligar o acerto de contas com o compromisso europeu de quarta-feira, em Viena.


Encomenda despachada na primeira parte, devidamente selada com os golos de Varela e Jackson. Tudo o resto foram cenas secundárias de um espetáculo virado mais para a forma do que o conteúdo.

Na verdade, e é esta a ideia mais forte, o Porto fez o necessário, o que lhe estava imposto desde o início. Só se o Gil Vicente tivesse marcado, e até teve uma boa fase nos primeiros 20 minutos do segundo tempo, é que os tricampeões teriam voltado a acelerar. Assim, contentaram-se com o expetável, o mínimo.

Nada a declarar, nada a acrescentar.

Aliás, até na forma utilitária como os golos foram alcançados - Varela em recarga a si mesmo e Jackson a encostar sem oposição - somos remetidos para ideia de um produto essencial e básico.

Nada foi supérfluo ou excessivo. O Porto detesta esbanjar, é uma equipa de recursos sólidos e contas em dia, pelo menos quando a mais não é obrigado. As notas soltas, fora do tom, saíram do estreante Quintero (Lucho foi poupado de início) e do regressado Varela.

O colombiano, confirma-se, é mesmo geniozinho. É fantástico em espaços curtos, rapidíssimo a pensar e a definir. Vai ser um caso sério, a médio prazo. Varela, ainda assim, terá sido o mais inspirado, ao fazer um golo e a ter uma mão cheia de ações convincentes.

Do Gil Vicente pouco há a dizer. Entrou sustentado numa base frágil (os dois centrais titulares estavam indisponíveis) e cedo tremeu. Até cair. João de Deus tentou emendar a mão ao lançar Bruno Moraes, um dos melhores, mas aí já a pintura estava borratada e irrecuperável. Como o Ecce Homo, de Borja, em Espanha.

Os minhotos quiseram algo mais do jogo a partir do reatamento, sem dúvida, mas mesmo esse empertigamento se diluiu rapidamente. Bastou ver o FC Porto a acelerar ligeiramente o ritmo e a tentar dar alguma animação a uma história vulgar, onde o mais forte usa e abusa do mais fraco.

O Porto fez o que quis da partida e parte para a Áustria de mente fresca, pernas robustas e, acima de tudo, contabilidade irrepreensível.

Nos dias que correm, coisa assim até pode passar por um ato de heroísmo. Afinal, esqueçam a primeira frase da crónica. 

FC Porto-Gil Vicente, 2-0 (destaques)

FC Porto 2 0 Gil Vicente (REUTERS) A Figura: Silvestre Varela

Os dados exuberantes da pré-época foram reativados diante do Gil Vicente. No golo teve o mérito de surgir na zona de tiro e depois de não desistir à primeira. Mas Varela teve muito mais. Naquele estilo a sugerir um desinteresse que, afinal, não é mais do que serenidade, o extremo levou Luís Martins ao cabo das tormentas. Segurou bem a bola, aproveitou o apoio de Danilo e saiu de confiança renovada. Teve o 3-0 nos pés aos 66 minutos e disparou ao lado. Os elogios de Paulo Fonseca, na quinta-feira, tinham razão de ser. Fizeram-lhe bem.

Negativo: lesão de Maicon No dia em que cumpria 25 anos, uma lesão atirou-o para fora das quatro linhas ainda o jogo não tinha 15 minutos. Os problemas físicos não o largam. No primeiro golo, o passe de cabeça para Varela é dele. Azarado da noite.

Juan Quintero

Um pouco por todo o lado, o pedido tomava a forma de exigência: deixem o menino jogar. Paulo Fonseca, aproveitando a proximidade do jogo em Viena, sentou Lucho e entregou a posição-dez a Quintero. Teste, mais um, superado. Ótimo em espaços curtos, repentista, sempre a tentar a tabela ou o passe em profundidade, Quintero é definitivamente um executante de espaços interiores. A plateia rejubilou ao confirmar o que se vem antecipando: é um talento inato, um pequeno génio deste maravilhoso jogo chamado futebol.

Jackson Martinez

Cinco jogos oficiais, cinco golos. É ponta-de-lança, ganha a vida a crucificar balizas contrárias e justifica a cada ação a alcunha de Cha Cha Cha. Mal toca na bola, Jackson baila, agarra a donzela pela anca, leva-a nos passos certos, embala-a até ao limite do torpor. Depois, sacrifica-a na hora do remate. É um atleta extraordinário, completíssimo, digno das loucuras de proponentes do calibre de Nápoles, Chelsea ou ManCity. Seja como for, está de corpo e alma no Dragão.

Diogo Viana

No FC Porto nunca teve a oportunidade de chegar ao plantel principal. Tem crescido bem. Maturou em Penafiel e surge no Gil Vicente já como um extremo de qualidade interessantíssima. Na primeira parte foi o único a ter a coragem de conduzir a bola e incomodar os adversário. No segundo tempo, veloz e tecnicista, fez alguns cruzamentos perfeitos. Um jogador para acompanhar.

Bruno Moraes

Aplaudido no regresso ao Dragão. Soube segurar a bola, usar o corpo e incomodou Helton em duas ocasiões. Merecia, pelo que fez, ter sido titular.

Steven Defour

Irrepreensível durante 90 minutos. Seguro no passe, nas compensações, muito mais confiante na forma como pediu a bola e comunicou com os colegas. Chegou de alma renovada da seleção da Bélgica. 

in "maisfutebol.iol.pt"

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