terça-feira, 7 de setembro de 2010

Liderança é marca de Villas-Boas


Os mais de mil participantes no estudo de opinião realizado pela Eurosondagem consideram que a capacidade de liderança e as opções tácticas são os dois aspectos que mais contribuíram para o arranque de temporada protagonizado por André Villas-Boas no cargo de treinador do FC Porto. Certo é que, hoje, o treinador mais jovem da Liga já não é considerado um risco.

Há cerca de três meses, André Villas-Boas era um risco. O treinador que Pinto da Costa contratou à Académica para substituir Jesualdo Ferreira era visto como a antítese do professor. Muito novo e pouco experiente, Villas-Boas tinha escassas provas dadas e, a seu favor, para além do trabalho realizado na Académica durante a última época, jogava essencialmente o tempo passado ao lado de José Mourinho em Portugal, Inglaterra e Itália. Ainda assim, para muitos André Villas-Boas representava uma aposta no escuro enquanto treinador, sobretudo para um candidato ao título e logo numa época que tinha de ser de reafirmação do FC Porto, após um atípico terceiro lugar no campeonato.

Em pouco mais de três meses - completa cem dias à frente do FC Porto na sexta-feira -, André Villas-Boas passou de incógnita a certeza, reforçada pela sequência de seis jogos oficiais a ganhar que começou com a conquista da Supertaça ao Benfica, mas também pelos registos impressionantes da equipa, que leva 15 golos marcados e apenas dois sofridos. Por isso mesmo, não é exactamente uma surpresa que o treinador do FC Porto mereça a distinção, por parte dos mais de mil entrevistados pela Eurosondagem para a elaboração deste Termómetro, como um dos melhores treinadores da Liga, praticamente a par de Domingos (ver página 8). De resto, também não é uma surpresa que os participantes neste estudo de opinião destaquem a capacidade de liderança e a mestria táctica como qualidades que suportam o excelente arranque de temporada do treinador portista. Chegar a um clube a meio de um processo revolucionário em curso e assumir a reconquista do título como objectivo principal e a vitória na Liga Europa como meta, enquanto lida com um balneário que perdeu algumas das suas principais referências e que regista a média de idades mais baixa do futebol português, tudo sem comprometer os resultados desportivos, é uma clara demonstração da sua capacidade de liderança.

Ora, a capacidade para se assumir como um líder num clube com a dimensão do FC Porto era uma das dúvidas que levavam parte da crítica a considerar André Villas-Boas uma aposta de risco. Outra era a sua capacidade para mudar o estilo de jogo de uma equipa formatada por Jesualdo Ferreira ao longo dos últimos quatro anos. O facto é que sem mudar radicalmente o conteúdo - João Moutinho é o único reforço contratado esta temporada que assegurou entrada directa para o onze titular -, André Villas-Boas mudou o estilo de jogo do FC Porto, trocando as transições rápidas do antecessor por um futebol mais apoiado onde a posse e a circulação de bola assumem um papel preponderante, com resultados evidenciados pelo registo de seis vitórias em seis jogos. Claro que as tácticas são suportadas pela escolha dos jogadores que as interpretam e, a esse nível, a opção por dois médios criativos, como são João Moutinho e Belluschi, e a mudança ideológica em relação ao papel desempenhado por Fernando enquanto trinco são pedras basilares do futebol praticado pelo FC Porto. Juntem-se a estes aspectos as competências técnicas reunidas por Villas-Boas ao longo da última década, o seu discurso assertivo e personalizado e o apoio de uma equipa técnica escolhida criteriosamente, e o resultado é o reconhecimento expresso no Termómetro.

As competências

Impressionou Bobby Robson com relatórios e não tardou a integrar-se na estrutura do FC Porto, onde se cruzou com José Mourinho. Tornou-se no observador principal dos adversários, ganhando visibilidade nas campanhas europeias dos portistas. Da cumplicidade com Mourinho nasceu uma relação de confiança que haveria de lhe garantir lugar na equipa técnica que assumiu o Chelsea em 2004/05. Villas-Boas manteve-se como observador preferido de Mourinho, partilhando a experiência em Inglaterra e Itália e quebrando a parceria em Outubro de 2009, altura em que assumiu o comando da Académica, garantindo a permanência.

A constituição da equipa técnica

Poucos deram importância a este pormenor, apesar das inúmeras mudanças operadas. José Mário, o preparador-físico, transitou de Coimbra. Foi o único a acompanhá-lo directamente. Vítor Pereira, que já tinha trabalhado nas camadas jovens do FC Porto, tal como Villas-Boas, assume o papel de braço-direito. A fechar o grupo, há ainda Pedro Emanuel, que assume parte do diálogo com os jogadores, socorrendo-se da experiência de balneário. Wil Coort trata dos guarda-redes.

O discurso

Directo e com a preocupação de passar algumas ideias que sabe, à partida, que dão bons títulos de jornais, como os "monólogos de Jesus", ou destaque em rádio e televisão. Não costuma deixar perguntas penduradas, e o discurso articulado garante-lhe uma mensagem clara. Se Mourinho for mesmo uma referência, como é natural que seja, saberá certamente que parte essencial da estratégia passa pelos "mind games" para consumo interno e externo. Para já, só pouco mais de cinco por cento dos inquiridos sublinha esta parte, que se entronca também com a liderança.

A Capacidade de liderança

Os jogadores que já trabalharam com ele gabam-lhe a capacidade de trabalho, característica indispensável a um líder e traduzida num planeamento exaustivo dos treinos e da abordagem aos jogos. Essa é uma explicação possível para justificar que tenha sido esta a característica mais destacada pelos inquiridos. Mas o mais provável é que essa imagem de liderança esteja interligada com o discurso e com as mensagens que Villas-Boas foi passando nestes quase cem dias de trabalho no Dragão. Por exemplo: assumiu que voltará à Champions como campeão no próximo ano; disse que está nos planos ganhar a Liga Europa; explicou que queria ser líder do campeonato já nesta paragem - e é mesmo; e foi porta-voz de críticas importantes, designadamente quando lembrou que Jorge Jesus não faz conferências de Imprensa antes dos jogos ou quando sugeriu que Raul Meireles não estava a treinar como devia e que tinha soluções tão ou mais competentes para o substituir.

A escolha de jogadores

O bom desempenho de reforços como Moutinho ou Souza talvez tenha contribuído para a imagem de que escolhe bem jogadores, ainda que a participação, neste particular, possa ter sido limitada. Aliás, um dos que parece ter escolhido directamente, Emídio Rafael, ainda não entrou nas opções. Villas Boas destaca-se, isso sim, na recuperação de alguns jogadores, como Sapunaru ou Belluschi, que transitaram do último plantel e que só agora assumiram protagonismo.

As opções tácticas

Herdou o 4x3x3 que já era imagem de marca de Jesualdo Ferreira, mas avisou logo que não se queria limitar às transições rápidas, preferindo um futebol de posse de bola. Moldou alguns jogadores a essa fórmula, sendo Fernando um dos casos evidentes. Mais do que ser apenas um trinco clássico, com posicionamento defensivo, Villas-Boas tem exigido do brasileiro uma participação efectiva nos desequilíbrios criados no ataque. E com êxito. Aliás, o FC Porto tem sido particularmente eficaz, com 15 golos marcados e apenas dois sofridos. Há mais: no segundo jogo do play-off com o Genk, e porque disse ter um meio-campo recheado de opções, Villas-Boas ensaiou um 4x4x2 alternativo, juntando Fernando, Souza, João Moutinho e Rúben Micael no meio. Sem ter sido perfeita, a experiência serviu pelo menos para mostrar que têm sido trabalhadas alternativas, potenciando as características do plantel. Neste capítulo, Hulk tem sido um dos destaques, adaptando-se bem ao 4x3x3 clássico, mas também à alternativa proposta. Outro detalhe: os lances de bola parada aparecem agora com outra eficácia. Hulk e Belluschi têm estado em evidência.

in "ojogo.pt"

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